"Recordo que, no primeiro clássico entre Vasco e
Flamengo no Maracanã, em 1950, ocorreu uma disputa por espaço entre o nosso
grupo e a Charanga do Jaime de Carvalho - que foi a primeira torcida do Flamengo
a surgir.
A partida aconteceu em um domingo e, quando subimos a rampa, nos
posicionamos do lado direito das tribunas e eles do lado esquerdo.
Como os
torcedores não usavam camisas nas arquibancadas, nós precisávamos mandar os
rubro-negros embora da nossa área. Diante daquela situação, eu, a Neide, a
Margarida Portugal, a Norma Uchoa e a Dona Idalina David fomos até um guarda e
pedimos para ele chamar o Jaime. Ele era um gentleman e nos tratava com muito
carinho.
Conversamos e ficou estabelecido que ele iria chamar os torcedores dele
para lá e nós faríamos o mesmo com os nossos.
A divisão que começou naquele dia
permanece até hoje. Daqui a uns anos, eu já não estarei aqui, mas sei que isso
vai durar para sempre.
" Então, ficou dividido assim: Lado direito (Sul): Vasco e
Botafogo Lado esquerdo (Norte): Flamengo e Fluminense 7 Quando o Fluminense
jogava contra o Flamengo, o Fluminense ia para o lado direito. E o Botafogo,
quando jogava contra o Vasco, ia para o lado esquerdo.
Ao todo, eram 23 salas no
3º andar do Maracanã, onde as torcidas guardavam repiques, surdos, cornetas,
bandeiras, fogos, entre outros.
A ocupação era fruto de concessões antigas que
dividiram o espaço de acordo com o tamanho das torcidas. As organizadas do
Flamengo tinham 7 salas, as do Botafogo 5 salas, mesmo número do Vasco (5), e as
do Fluminense 4 salas. As torcidas do América e do Bangu tinham apenas uma sala
cada uma.
As salas do Vasco eram a da Força Jovem (desde 1974), Sala 330-A, TOV
(desde 1967), Sala 314-A, Pequenos Vascaínos (Sala 322-B), Renovascão e uma sala
dividida entre a Força Independente do Vasco e a Anarquia.
A torcida do
Fluminense, algumas vezes, guardava o material na sala da torcida do Vasco no
Maracanã. Como a sala deles ficava no mesmo lado da torcida do Flamengo, quando
tinha jogo entre eles, para evitar certos problemas, eles deixavam o material na
sala da torcida do Vasco. "Já cheguei no Maracanã e o material da torcida do
Fluminense estava na nossa sala e nós, todos em sinal de respeito, nem chegamos
perto. Isso era através da amizade que Ely Mendes tinha com alguns integrantes
da Torcida do Fluminense por causa do Carnaval na Portela Tradição, nome da
época da Escola de Samba, e tinha também amizade com a galera da Raça
Rubro-Negra", concluiu Caíco.
"Só para lembrar, a FJV e Young Flu tinham uma
amizade também nos anos 1980, tanto que cansamos de emprestar a nossa sala no
Maracanã a eles, quando jogavam contra o Flamengo, assim como já emprestamos a
bateria a eles e eles a nós. Tínhamos também amizade com a Fiel Tricolor e a
Garra Tricolor, mas nunca tivemos amizade com a Força Flu, falou Português.
Lembro também da Torcida do Botafogo. As salas das torcidas do Botafogo ficavam
também à direita da Tribuna de Honra, próximas da nossa. Quando eles jogavam
fora do Maracanã, quantas vezes, no fim do jogo do Vasco, aquela Kombi preta com
o material da Torcida Jovem do Botafogo, Mancha Alvinegra, Raça Alvinegra, TOB
ou da Folgada do Russão, chegava no meio da torcida do Vasco e o pessoal abria a
sala para deixar o material. Tempo bom esse, havia muito respeito entre as
organizadas, disse Flávio de Cabo Frio.
Em 1972, no Maracanã, ainda não tínhamos
sala e éramos obrigados a guardar os materiais, as bandeiras e a bateria junto
com a organizada da Dulce (TOV). Foram dois anos assim, até que o Ely, perante
ao Otávio Pinto Guimarães, que na época era o presidente da ADEG (com a fusão
dos estados do Rio e Guanabara em 1975, mudou o nome para SUDERJ) e a Federação
Carioca, conseguiu a sala para a torcida em 1974.
E o pensamento de todos era
fazer com que a nossa sala fosse um exemplo, onde todos, não só nós, os
componentes, mas todos os vascaínos, pudessem entrar e se sentir orgulhosos.
Para isso, começamos a buscar matérias em jornais, principalmente Jornal do
Brasil e dos Sports. Pegávamos as fotos que eles tiravam da torcida e começamos
a fazer quadros. Então a sala se tornou um museu. Todos queriam olhar aquelas
fotos e reportagens. Ali tinha muitas histórias, reportagem com a primeira
torcida a ir à Fonte Nova, que o Ely fez questão de fazer um quadro e postar na
parede da sala. Ele tinha orgulho dessa reportagem. Hoje, infelizmente, ninguém
me responde quando pergunto onde foram parar esses quadros. O único quadro que
consegui foi o do carnaval, que eu apareço segurando a bandeira da FJV. E é uma
pena que esse material tenha sumido, mas quem um dia entrou na sala daquela
época, acho que ficou até 1994, vai se lembrar desses quadros, falou Carlinhos
Português.
Com a Associação de Desportos do Estado da Guanabara (ADEG), as
torcidas pediram cartão com autorização para a entrada no estádio e foi dada
permissão. A sala também foi concedida pela ADEG. Mas, da mesma forma que eles
deram, eles tomaram, quando se perdeu o controle da situação em 1994. No início,
eram poucas salas, uma para cada clube. Depois, todas as torcidas receberam sala
e virou uma bagunça, com invasão e arrombamento, além do consumo de tóxicos, que
existia nas viagens também. Tentava-se controlar, mas não conseguia. Em relação
à Federação do Estado do Rio de Janeiro, diz que Eduardo Viana, o Caixa d’Água,
tirou todos os benefícios dados por Otávio Pinto Guimarães, quando este presidiu
a Federação.
No período do Otávio, todos os chefes de torcida eram beneméritos
da FERJ (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) e tinham uma
excelente relação com ele, disse Sérgio Aiub, da Torcida Organizada do
Fluminense (TOF) e depois da Torcida Jovem Flu.
Me lembro muito bem de 4 salas:
a da TOV era a primeira à direita do Maracanã, atrás das cabines de rádio, ao
lado do posto médico do estádio. Próximo ficava a da Pequenos Vascaínos, que, no
começo dos anos 1990, era ponto de encontro da Força, já que tinha um bar e a
galera ficava tomando cerveja. A da Força ficava bem atrás do placar e da
Renovascão, mais em direção à rampa de Bellini, próximo à sala da Torcida Jovem
do Botafogo. Eu sempre admirei as torcidas organizadas. Nos anos 1980, tirava a
minha camisa da Força e dava uma volta completa no estádio, entrando nas salas
das outras torcidas organizadas. Tinha rivalidade, mas ainda dava para fazer
isso. Nos anos 1990, isso ficou impossível, falou Flávio de Cabo Frio,
ex-componente da Força Jovem.
Em novembro de 1994, as salas das torcidas no
Maracanã chegaram ao fim. As salas existiram durante mais de 20 anos.
A Suderj
criou uma medida contra a violência e despejou as torcidas que tinham sala no
estádio.
A perda das salas ocupadas no Maracanã pelas torcidas, a proibição de
se concentrarem em dia de jogos em certos locais, o fim das credenciais dadas
pelos dirigentes às torcidas e que permitiam o acesso gratuito pelo Portão 18 do
Maracanã, onde as torcidas se encontravam incitando, ainda mais, seus
antagonismos, a decisão de estabelecer acessos por portões diferentes, foram
atitudes citadas como importantes, no sentido de reduzir os enfrentamentos.
Entretanto, a despeito de todos esses dispositivos, alguns líderes admitiram que
determinados jogos (Vasco e Flamengo, por exemplo) exigem uma forte intervenção
policial, do contrário, os embates serão inevitáveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário