quarta-feira, 28 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1935 CONCURSO DOS JOGADORES

“votos,votos para Rey”
      apelo de Polar aos vascaínos
1935                Concurso dos Jogadores

Enquanto a cidade do Rio de Janeiro se preparava para o carnaval cantando o grande sucesso daquele ano, a marchinha de André Filho, “Cidade Maravilhosa”, o verão carioca era sacudido com os amistosos das equipes argentinas na capital do país e com a repercussão da saída do Vasco da Liga Carioca de Futebol, em função de uma briga com o Flamengo, originado de uma discussão no remo, no final de 1934.
            Era a primeira vez que os times do Boca Juniors (campeão argentino em 1934) e do River Plate se apresentariam no Rio de Janeiro, numa excursão que incluiria uma seqüência de amistosos na cidade de São Paulo.
De sua chegada até sua despedida do país não faltaram fotos dos jogadores argentinos nas primeiras páginas, especialmente no dia 18 de janeiro quando os argentinos posam amigavelmente com vários jogadores do Vasco ao treinarem juntos em São Januário, como forma de preparativo para o primeiro amistoso contra o Botafogo no dia 20 no mesmo estádio. Diga-se de passagem, o Boca ainda não havia construído o seu estádio.
Ao empatar em 3 a 3, o Vasco comemorou o resultado como uma vitória pois perdia de 1 a 3 e temia-se uma nova goleada dos argentinos que venceram o Botafogo por 4 a 0. O grande destaque da partida foi o meia Fausto, considerado o melhor homem em campo, o que motivou o líder da torcida[1] vascaína, João de Luca, promover uma lista para comprar uma medalha de ouro em homenagem ao jogador.
O intercâmbio com o futebol brasileiro acabou aumentando o interesse dos clubes argentinos de contratarem mais jogadores do Brasil. Em fevereiro de 1935 é anunciada a venda de Waldemar de Brito (Botafogo) para o San Lorenzo. Mas a maior investida do futebol argentino naquele ano ainda estava por vir: no dia 6 de fevereiro estoura a notícia de que o Boca já havia iniciado os entendimentos  para levar Domingos da Guia (Vasco) para disputar o campeonato argentino de 1935. Dois dias depois fez a vez de anunciarem a negociação de Fausto com outro clube argentino, o San Lorenzo.
Nem mesmo a grande atuação de Domingos da Guia (considerado o melhor jogador em campo) salvou o Vasco de um resultado muito ruim. O River venceu facilmente por 4 a 1. Entre os destaques dos argentinos estava Moreno, que viria  a ser um dos principais jogadores de todos os tempos do River Plate, fazendo parte do lendário time dos anos 1940, intitulado “la Maquina”.
            Uma seleção brasileira era formada as pressas para enfrentar o River Plate em sua despedida do Brasil. A CBD convoca principalmente jogadores do Vasco, motivando seus torcedores pois seria a possibilidade deste clube fazer uma revanche contra os argentinos.
            Na despedida do River havia a promessa de, num futuro próximo, um novo jogo entre ele e o Vasco na Argentina (o que acabou não acontecendo). A partida seria a última de Domingos que, em poucos dias, deixaria em definitivo o Vasco para se juntar com as estrelas do Boca Juniors. Sua saída foi dramática para o clube brasileiro que, por duas semanas, fez uma série de contrapropostas para evitar sua saída. Neste período os jornais procuraram acompanhar passo a passo o empenho dos dirigentes vascaínos (que fizeram de tudo para manter o atleta no clube). Terminado o carnaval de 1935 o jogador embarcaria para Buenos Aires, onde seria campeão argentino no mesmo ano.
Os jogos contra os argentinos foram um sucesso de público, o que motivou a seguinte manchete do Jornal dos Sports em 27 de fevereiro: "Vasco proporá a CBD a realização de um torneio que representará um autêntico Sul-Americano Interclubes".
            Se preparando para o campeonato carioca de 1935, o clube recebe uma pressão dos torcedores e sócios vascaínos, para a reintegração de Tinoco ao elenco, ele que foi um dos que abandonaram o clube para disputar a Copa na Itália em 1934: “o Sr João de Lucca, um dos “Leaders” da Torcida Vascaína. Dirige ele o movimento pelo veterano Campeão do Vasco. Divulgamos hoje o abaixo assinado que os Sócios e torcedores do Club cruzmaltino dirigirão a Diretoria, solicitando o cancelamento da pena de eliminação sofrida pelo conhecido player Tinoco. (...) A lista principal de assinaturas está em poder do João de Lucca, um dos Leaders da Torcida no Largo de São Francisco, esquina com Ouvidor.. “Estamos trabalhando pelo indulto de Tinoco. É um Vascaíno da velha guarda e  não pode estar afastado do Club.” (...) É o abaixo assinado dos sócios e torcedores, o Vasco decidiu cancelar a pena imposta ao half... Não precisamos destacar a justiça de tal medida. Acompanhando o movimento encabeçado por Fausto e trabalhado pelos conhecidos torcedores Vascaínos João de Lucca e Júlio Gamado junto a Torcida”[2].
            De agosto até o final do ano a campanha da torcida vascaína foi para eleger o goleiro Rey como o maior ídolo do futebol carioca, numa promoção das “Balas Favoritas”. A última campanha para conhecer o maior ídolo carioca tinha sido em 1930 e Russinho do Vasco foi o escolhido. Agora era a vez do líder da torcida vascaína, Polar, fazer campanha pelo maior estrela do clube no momento e que segundo alguns era namorado da cantora vascaína Aracy de Almeida. Diz a reportagem: “CONCURSO DAS BALAS FAVORITA DOS JOGADORES. Um apelo de Polar aos torcedores do Vasco da Gama, apoiada pelo keeper dos cruzmaltinos. Polar, cabo chefe de Rey, esteve em nossa redação em companhia do grande e popular arqueiro Vascaíno. O festejado propagandista disse-nos:“Sou o cabo Chefe aqui do meu amigo Rey, candidato dos Vascaínos no Concurso das Balas Favorita dos Jogadores. Todos dizem que a Torcida do Vasco é a mais poderosa do Rio, entretanto, o Rey ainda permanece em segundo. É um absurdo. Apelo para os torcedores do Vasco da Gama. Demostremos o nosso valor, a nossa pujança (,,,) Rey, o arqueiro Vascaíno, disse-nos. “Entrei no Concurso, confiante no valor extraordinário da Torcida do Vasco da Gama. Espero que todos os Vascaínos se coliguem e levem-me votos, afim de que na próxima apuração, a nossa Torcida sobrepuje a do Flamengo (...) Rey e Polar pediram-nos tornar público, que hoje, estarão no Estádio do Vasco, para receber dos vascaínos sinceros votos das Balas Favoritas dos Jogadores”[3].
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.



[1] A renda foi de mais de 121 contos, para um excelente público.
[2] Fonte: Jornal A Noite 18 e 28 de Março de 1935,
[3] Fonte: Jornal dos Sports 22 de Agosto de 1935.

Vasco Jornal dos Sports 1935

Vasco Jornal dos Sports 1935


domingo, 25 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1934 O REI MOMO É VASCAÍNO

 “aclamado o Rei da Folia”
    Affonso Silva, o Polar
1934                 O Rei Momo é Vascaíno

            O carnaval carioca nos anos 1930 passava por grandes transformações com sua popularização, aliada com a força crescente do rádio comercial e da indústria fonográfica. Novos atores sociais começam a aparecer, entre eles a figura do Rei Momo. No ano de 1934 era feita a primeira eleição para a escolha do representante oficial da folia e venceu o vascaíno Polar: “Affonso Silva foi aclamado o Rei da Folia. Encerrou-se ante ontem, o brilhante e oportuno Concurso instituído pelos nossos colegas da A Pátria, para a escolha por votação popular, do folião que devia ser aclamado Rei Momo. Após um prélio renhido e entusiasmo, os cariocas escolheram para exercer as altas funções de Rei da Folia o consagrado folião Affonso Silva, o Polar, que era candidato da casa O Mandarin. Chaby, o vigoroso folião dos Fenianos alcançou o segundo lugar, deixando Chico Rocha em terceiro” [1].
            Para o campeonato carioca o Vasco montava uma verdadeira seleção trazendo jogadores do exterior, como Domingos da Guia (Argentina) e Leônidas (Uruguai). Fausto retornava ao clube, além de outras contratações. O time ficou conhecido com “esquadrão dos 100 contos”, uma fortuna para a época.
            A vitória incontestável em campo animou os torcedores que organizaram uma caravana para São Paulo para ver o clube disputar uma partida em retribuição a visita dos paulistas ao Rio de Janeiro: “CARAVANA VASCAÍNA PARA SÃO PAULO: O Vasco está organizando um Trem especial para conduzir a São Paulo os seus associados, adeptos e amigos, afim de que os mesmos possam assistir, domingo, na Capital bandeirante, a revanche que ele proporcionará ao São Paulo F. C. As instruções para os que quiserem seguir na Caravana Vascaína, já se acham abertas na secretaria do Club de Domingos. O referido Trem especial partirá Sábado e estará de volta, domingo a noite” [2].
Para este jogo a torcida sabia que não veria mais o talento de Leonidas da Silva vestindo a camisa do Vasco. O atleta seria contratado a peso de ouro pela CBD para representar o Brasil na Copa do Mundo da Itália. Leônidas tornou-se um dos profissionais que foram contratados pela CBD no final de abril. Na volta ao Brasil, Leônidas seria transferido ao Botafogo.
A CBD praticava o amadorismo marrom, pois oficialmente era contra o profissionalismo mas a maioria dos melhores jogadores do Brasil jogavam nas ligas profissionais. Para montar a seleção brasileira, a entidade máxima do futebol brasileiro passou a assediar os jogadores com propostas econômicas vantajosas. “Os jogadores que a CBD mais cobiçava estavam praticamente todos numa só equipe o Vasco da Gama de Leônidas e seus negros famosos. Domingos, Fausto, Tinoco e o goleiro Rey foram os mais assediados” (Ribeiro, 1999. p. 55). Para evitar que o clube perdesse mais jogadores a diretoria pedia aos torcedores e associados que se cotizassem e ajudassem o clube com propostas financeiras que cobrissem a CBD. Deu certo, menos com Tinoco que também se juntou ao elenco que disputou o mundial na Itália.
Outras caravanas de torcedores teriam prosseguimento em toda a cidade do Rio de Janeiro acompanhando os atletas de várias modalidades esportivas. Até mesmo para prestigiar o basquete infantil em Vila Isabel, foram requisitados 5 ônibus especiais, organizado por João de Lucca, o chefe da torcida Vascaína, conforme sinalizava o Jornal dos Sports. Pouco depois uma outra grande caravana seguia para a Gávea para uma disputa no basquete adulto. Culminou com um amistoso em Bangu entre um combinado da CBD e o time local, assim descrito: “para conduzir a Torcida do Vasco, a “Frente Única Vascaína” fretou um Trem especial, no qual também seguirão os jogadores do combinado cebedense” (Diário da Noite 22 de dezembro).
No final do ano o Botafogo, clube que tinha maior prestígio junto a CBD, comemorava o tricampeonato (disputando com clubes de menor expressão em 1933 e 1934) conseguiu se aliar com o Vasco para formar uma nova liga de futebol no Rio de Janeiro. Embora oficialmente recusasse o profissionalismo o clube aceitava o modelo misto do profissionalismo e amadorismo. Na prática era uma tendencia inevitável para o clube não acabar: “quanto mais o clube gastava, melhor para ele. Os clubes que não gastavam, os clubes amadores, as moscas. Os sócios desertando, os torcedores não aparecendo nos campos. O Botafogo viu-se reduzido a 300 sócios, dos 3.500 que tinha” (Mario Filho, 2003, p.205). Aos poucos o Botafogo ia se convencendo que o amadorismo estava com os dias contados, era preciso largar o amadorismo e contratar jogadores, de preferência brancos, com exceção de Leônidas.
            A saída do Vasco da Liga Carioca de Futebol foi em função de uma briga entre dirigentes de Vasco e Flamengo no campeonato de remo no final de 1934. Os cartolas do Botafogo, aproveitando-se deste impasse, sugeriram aos cartolas do Vasco que recorressem a CBD. Assim, restou ao Vasco largar a Liga com Flamengo, Fluminense e América e juntar-se ao Botafogo.
A força da CBD no campo esportivo ganhou novos contornos quando o Vasco (campeão carioca de 1934) tomou a atitude de  romper com a Liga Carioca de Futebol (LCF), que era ligada a FBF e passar para o lado da CBD, se juntando ao Botafogo na criação da Federação Metropolitana de Futebol (FMF) em substituição a Associação Metropolitana de Esportes Atléticos (AMEA). Juntamente com o Vasco saíram o São Cristóvão (vice-campeão em 1934) e o Bangu. Estes dois clubes de menores torcidas, mas de tradição e legítimos representantes das Zonas Norte e Suburbana.. O clube carioca que mais se beneficiava com esta decisão era o Botafogo tricampeão carioca pela AMEA (1932-33-34), quando disputou os dois últimos campeonatos com clubes de menor expressão. Na disputa entre a AMEA e a LCF, esta saía na vantagem em 1933 e 1934 com campeonatos de maior público, cobertura na imprensa e reunião dos maiores craques. Em 1935, com a cisão do futebol carioca, a divisão de interesse do público seria mais equilibrado.
            Em São Paulo, os dois principais clubes (Palestra e Corinthians) rompiam com a FBF e passavam para o lado da CBD, o que apontava uma possível retomada da entidade dos rumos do futebol brasileiro. O presidente do Conselho Deliberativo da CBD, Luiz Aranha, junto do delegado da entidade, Carlito Rocha, foram dois personagens importantes para a compreensão do processo que ocorria naqueles anos de embate político, ideológico e pessoal. O primeiro dirigente era irmão do futuro ministro das relações exteriores do Governo Getúlio Vargas (1930-1945), Oswaldo Aranha, e o segundo era dirigente da AMEA desde os anos 1920. Os dois foram os grandes articuladores para trazer o Vasco para o seu lado e enfraquecer a Liga Carioca de Futebol, que tinha um inegável domínio do futebol carioca desde a criação do profissionalismo em 1933. Os dois dirigentes eram ligados ao Botafogo, clube carioca que mais lutou contra o profissionalismo e a inserção dos negros em seus times.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.



[1] Fonte: Diário de Notícias 02 de Fevereiro de 1934.
[2] Fonte: Jornal A Noite 13 de Maio de 1934

Vasco Jornal A Noite 1934

Vasco Jornal A Noite 1934


sexta-feira, 23 de setembro de 2016

VASCO 2016: "TIME DA VIRADA": A HISTÓRIA DA CANÇÃO QUE EMBALA O VASCO

Famosa música criada pela Torcida Vascaína foi inspirada na Beija-Flor e volta à tona para duelo com o Santos, pela Copa do Brasil. Ouça as versões na voz de Neguinho
Em   cada ocasião na qual o Vasco precisa superar uma situação adversa, a expressão "Time da Virada" é resgatada.
 O que pouca gente sabe é como surgiu a música.
Atual presidente da TOV (Torcida Organizada do Vasco), Jorginho ( Obs: ele é Diretor, a Presidente é Márcia Soares), homônimo do atual treinador, garante que a criação é de um antigo membro do grupo, inspirada no samba da Beija-Flor de 1978 (ouça Neguinho da Beija-Flor cantar as duas versões no vídeo acima). E arrisca lembrar a primeira vez em que fanáticas gargantas cruz-maltinas avisaram que o Vasco é o time da virada, é o time do amor. 
- A música é nossa. Foi o Henrique que fez. Mas ele sumiu da torcida, tem mais de 10 anos. Ninguém sabe por onde ele anda. Ele era muito bom nessas músicas, morava em Nova Iguaçu. Foi num jogo contra o Fluminense, que o Vasco virou para 2 a 1 com gol do Bismarck - lembrou o torcedor. 
O jogo em questão aconteceu em 29 de maio de 1988. O Vasco perdia para o Fluminense até os 35 minutos do segundo tempo, quando Vivinho e Bismarck garantiram a vitória e o título da Taça Rio - em seguida, o Cruz-Maltino conquistaria o Campeonato Carioca em cima do Flamengo. 
Entretanto, o Vasco carregava a fama de especialista em viradas desde muito tempo.
Em 1975, uma seqüência de resultados conquistados desta maneira fez surgir a expressão "Vascão Vira-Vira". Faltava a trilha sonora. 

O REFRÃO IMORTALIZADO DE NEGUINHO
A inspiração veio de um samba da Beija-Flor. Em 1978, a escola de Nilópolis conquistou seu terceiro título do Carnaval com "A criação do mundo na tradição nagô". A música, na verdade, foi a junção de duas versões concorrentes. De um lado, ficou a letra de Gilson e Mazinho; do outro, que seria adaptado pela torcida vascaíno, o refrão composto por Neguinho da Beija-Flor.
- Neste ano eu nem ia fazer samba. Minha irmã de criação, chamada Dilsa, falou pra eu fazer. Tinha baile para eu ir em Mesquita, ela insistiu, me deu caneta, papel. Comecei meia-noite, terminei 6h. Tirei um cochilo, gravei no gravador só a voz e entreguei. No dia seguinte 9h, dei a fita cassete para o Joãozinho (Trinta, carnavalesco). O samba chegou na final e juntou com o do Gilson e do Mazinho - contou Neguinho. 
Flamenguista roxo, o cantor não se incomoda com o fato de uma de suas principais composições ter sido imortalizada pela torcida do Vasco. Vai além: agradece.
- É especial. Ficou para a história, foi o primeiro tricampeonato. Agradeço ao Vasco por ter imortalizado o samba. De 1978 para cá são 38 anos, e o Vasco não deixou o samba morrer. Como bom flamenguista e fã de futebol, agradeço à torcida do Vasco pela imortalidade.
Embalado pela tradicional música, que ganhou popularidade mesmo nos anos 1990.
Fonte: http://globoesporte.globo.com/futebol/times/vasco/noticia/2016/09/time-da-virada-historia-da-cancao-que-embala-o-vasco-em-novo-desafio.html e NETVASCO

Vasco time da virada

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1933 LIDERANDO O PROFISSIONALISMO


                                                          “ SALVE O LIBERTADOR VASCO DA GAMA”         
                                                                                     Manifesto dos jogadores paulistas

1933                     Liderando o Profissionalismo               

No primeiro ano de implantação do profissionalismo do futebol no Brasil a situação dos clubes foi de uma completa divisão, com a formação de novas ligas e briga com a principal entidade, a CBD (Confederação Brasileira de Desportos). Enquanto a CBD e vários clubes defendiam a permanência do amadorismo, as principais agremiações esportivas defendiam a mudança para o regime profissional. No Vasco, a polêmica também dividiu sua comunidade.
Não era somente entre os cartolas vascaínos que o tema demandava grandes debates. Torcedores, sócios, conselheiros, jornalistas e jogadores vascaínos levantavam as vantagens e desvantagens do novo regime.
E o Vasco foi decisivo para o sucesso da implantação do regime profissional. No começo do ano um acalorado debate no Conselho Deliberativo no clube resolve apoiar a mudança. O resultado foi uma reviravolta nos poderes do clube com a eleição de um novo presidente, Victor de morais e a repercussão imediata na imprensa. A notícia chegou em São Paulo onde um grupo de jogadores liderava um movimento de rebelião, entre eles estava Friedenreich. Os atletas enviam um telegrama aos cartolas vascaínos em defesa das novas regras exaltando a importância do clube nesta luta: “ SALVE O LIBERTADOR VASCO DA GAMA”, dizia um trecho da mensagem dos atletas.
A nova realidade implicava em tomar medidas rápidas para conseguir estancar a debandada dos principais jogadores para o exterior. Este foi o caso do maior zagueiro do Brasil: Domingos da Guia. O jogador do Vasco estava negociando sua saída para o nacional do Uruguai.
Se Domingos estava de saída, Fausto e Jaguaré estavam retornando ao clube, vindos da Europa. Os dois maiores jogadores do inesquecível campeonato carioca de 1929 voltariam a vestir a camisa cruzmaltina. Embora já fossem grandes ídolos da massa, não foi possível identificar grandes manifestações de afeto dos torcedores na chegada dos mesmos. Talvez parte dos torcedores também estivesse confusa sobre como se comportar diante dos jogadores, agora como profissionais. O fim do amadorismo apresentaria uma nova relação entre atletas e fãs. Mario Filho escreveu inúmeras crônicas sobre este momento de  transição.
Para a montagem do novo elenco vascaíno vários jogadores chegaram. Dos clubes que permaneceram amadores vieram o atacante Almir (Botafogo, campeão carioca em 1932) e o zagueiro Juca ( São Cristóvão). Do futebol paranaense chegaram o goleiro Rey e o atacante Carnieri. Do Pará, o artilheiro Quarenta, No entanto, o time principal perdia os talentos de alguns titulares: Mario Matos, Carlos Paes (84), Brilhante, Badu e outros preferiram não se profissionalizar.
O primeiro jogo da Era do Profissionalismo no Rio de Janeiro só aconteceu no início de abril, protagonizado por Vasco e América, os clubes que fizeram os clássicos mais emocionantes neste período. Não foi por acaso que o estádio de São Januário ficou lotado (cerca de 30 mil pessoas), demonstrando que o público carioca estava sedento pelos grandes jogos. A estupenda presença de torcedores foi comemorada pelos setores da imprensa que defendiam as mudanças nas leis do futebol.
Para o campeonato profissional da Liga Carioca de Futebol (LCF) cinco clubes eram os fundadores: Vasco, Fluminense, América, Bangu e Bonsucesso. Do outro lado, pela AMEA (amador), estavam Flamengo, Botafogo, São Cristovão, Andaraí etc.
O jogo de estréia do Vasco aconteceu no início de maio diante do Fluminense nas Laranjeiras. Apesar da derrota por 3 a 1, os vascaínos podiam, pelo menos, se contentar com a presença de mais um grande público que prestigiou em massa. No mesmo mês eram realizadas eleições para a Assembléia Constituinte. Entre as novidades da nova Lei estavam a garantia do voto secreto e a participação feminina pela primeira vez.
Também no Vasco a presença das mulheres nas diferentes modalidades esportivas era exaltada. As revistas destacavam a criação do departamento de Educação física Feminina. A presença feminina neste ano já tinha sido noticiada pelas revistas através dos Bailes a Fantasia no carnaval vascaíno e no Baile da Aleluia.
O clube vivia uma intensa vida social com as revistas destacando a ação dos escoteiros vascaínos, o lançamento da Revista oficial do clube (Cruz de Malta), o Tiro de Guerra e a campanha para novos sócios. Cerca de 500 novos sócios entraram no clube neste ano. Embora fosse registrada a presença de novos associados, a verdade é que a crise mundial ainda afetava bastante a vida de todos os grandes clubes cariocas. O Vasco que chegou a ter 10.000 associados no fim dos anos 1920, se contentava com 7.000 contribuintes no mês de seu aniversário em 1933.
                Este foi o ano do primeiro torneio entre os clubes de RJ-SP. Assim como os cariocas, o futebol paulista estava dividido. A saída era apostar numa competição inovadora. Era o primeiro ano em que as duas principais cidades do país veriam vários confrontos que empolgariam os torcedores. Destaque para os jogos entre Vasco e Palestra Itália (Palmeiras). Os dois clubes com as maiores torcidas em suas respectivas cidades. O Palestra que seria tricampeão paulista neste período (1932, 1933 e 1934), tinha uma verdadeira seleção. Venceu o Vasco nas duas ocasiões. Em São Paulo, no primeiro jogo , foi organizada uma caravana de sócios e torcedores vascaínos para incentivar o time. O jogo disputado no campo do São Paulo da Floresta estava lotado (recebeu cerca de 20.000 pessoas). O jogo não foi disputado no Parque Antártica pois este estádio estava em obras e seria inaugurado ainda neste ano com capacidade para 35.000. Em São Januário, novamente o estádio lotado e a recomendação da polícia era para o público evitar as vaias ao juiz e ao adversário. Porém, os maiores  apupos dos adeptos do Vasco ficaram para o goleiro Jaguaré. De herói a vilão, o arqueiro era acusado de vir falhando muito. Resultado: em seu lugar assumiu Rei, que com suas boas atuações, passou a ocupar rapidamente a posição de titular e novo ídolo dos cruzmaltinos até 1937.
                Neste torneio o Vasco fez uma campanha apenas regular ( terminou em 5 °lugar). Teve como novidade a adoção de um novo modelo de camisa com uma gola em formato de V. Coincidentemente, era o mesmo modelo adotado pelo Palestra.
                Acompanhando o noticiário da imprensa não foi possível registrar outros grandes momentos da torcida vascaína. Por exemplo, nas Laranjeiras, diante do fraco time do Flamengo (último colocado na competição), o Vasco conseguiu perder no campo e nas arquibancadas... E diante do Fluminense, na penúltima rodada aconteceu um fato curioso. Ao encerar a partida os jogadores do tricolor adotam o grito de guerra tradicional dos vascaínos e entoam a sua versão: “ao Fluminense Nada, Tudo”. Definitivamente o ano de 1933 não teve grandes comemorações esportivas. Até mesmo no Remo, que passava a ser disputado neste ano na Lagoa Rodrigo de Freitas, o Vasco perdeu o campeonato para o Flamengo interrompendo uma seqüência de campeonatos desde 1927. Este foi o único campeonato que o Vasco perdeu na década. De 1934 a 1939, o Vasco venceria todos.

O  ano de 1933 foi a primeira vez que o estádio de São Januário não teve a presença da seleção brasileira ou de amistosos internacionais, rompendo uma tradição desde a inauguração do estádio. Certamente o afastamento do clube do domínio da CBD (filiada a FIFA)  acarretou um prejuízo muito grande para os cofres do clube que deixou de arrecadar grandes somas. Restava a disputa entre as seleções regionais. Na seleção carioca, apesar da campanha regular no campeonato regional, o Vasco tinha a base da seleção: Rey, Itália, Gringo e Fausto. Ou seja, nenhum atacante. Sem dúvida a torcida vascaína queria ver um novo artilheiro no comando do time pois Russinho passou quase todo o ano envolvido em contusões. A volta de Leônidas ao Brasil, e a contratação de Gradim (Bonsucesso), principal atacante carioca serão a resposta dos dirigentes cariocas para o anseio de seus torcedores.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.

Vasco Revista Careta 1933




domingo, 18 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1932 EMBAIXADOR OLÍMPICO

Torcida do Vasco em Los Angeles
Manchete do Jornal

1932                       Embaixador Olímpico

           
            Para evitar as transferências foram criadas várias leis, algumas mais rigorosas e outras mais brandas. No começo dos anos 1930 valia a lei do Estágio, em que o jogador não poderia atuar no novo time como titular por um período de um ano. Apesar das leis, das reações dos torcedores, a verdade é que as mudanças continuavam acontecendo, tanto é que um jornal chegou a mostrar em uma grande manchete que 1932 seria o ano dos “borboletas”.
            Os próprios jogadores não sabiam como seria o futuro do futebol e davam respostas contraditórias sobre o profissionalismo, ora atacando, ora defendendo. Em agosto de 1931, Domingos afirmava: “sou contra o profissionalismo que destrói o sentimento familiar e patriotismo dos homens. Jamais sairei do Rio para o estrangeiro, como servo do futebol”. Dois meses depois o próprio jogador afirmava numa outra entrevista, uma posição totalmente diferente: “o profissionalismo e uma necessidade inadiável para o progresso do nosso futebol e a honestidade dos nossos rapazes (...) se eu for convidado a atuar num clube de profissionais, com vantagens, repito, abandonarei o amadorismo. Não me envergonharei de ser profissional” (Hamilton, 2005. pp. 70-71).
            Em 1932 o Vasco contratava o zagueiro Domingos da Guia mas pelo regulamento não poderia lançá-lo no time principal naquele ano, aguardando o tempo da Lei do estágio. A torcida teria que se contentar em ver o jogador disputando as partidas da preliminar.
            Depois do sucesso do concurso para enviar um torcedor ao Uruguai em 1930, a próxima competição internacional que mobilizou as redações cariocas foi a Olimpíada em Los Angeles, nos Estados Unidos. Dessa vez a disputa era para ser embaixador olímpico e contou com a participação conjunta do “Diário de Notícias e Jornal dos Sports vão custear as despesas com a ida de duas pessoas a Los Angeles para assistir aos Jogos Olympicos. Affonso Silva, o Polar, um dos mais fortes concorrentes ao Grande Concurso instituído pelo Diário de Notícias e o Jornal dos Sports, esteve, ontem em nossa redação, depois da apuração que havíamos realizado”[1].
Pouco depois uma outra notícia mostrava uma mobilização dos vascaínos para assistirem aos jogos em Los Angeles como atividade de turismo, inaugurando uma pratica que se tornaria habitual no final do século XX quando os esportes competitivos e suas competições mais famosas virariam uma nova fonte de receita para as agências de turismo. Na época a imprensa destacou desta forma o interesse na viagem: “A TORCIDA DO VASCO EM LOS ANGELES. O grande Club vai organizar uma caravana. O Sr Manoel Ramos o primeiro inscrito. A Torcida Vascaína é uma das mais entusiasmada que possuímos. É ardorosa, o seu entusiasmo não conhece limites. Os defensores do Vasco tem sempre a anima-los numerosos adeptos do seu Club. Ainda agora, os torcedores Vascaínos vão ter oportunidades de demonstrar o seu ardor. A Agência Exprinter, que está organizando uma grande caravana para ir a Los Angeles, assistir aos jogos Olimpicos, entre em combinação com o Vasco da Gama, afim de que um grupo de torcedores do prestigiado Club possa torcer pelos seus atletas na importante competição mundial.As inscrições estão com o Sr Raul Campos, Presidente do Club. O primeiro Vascaíno a inscreve-se foi o Sr Manoel Ramos, ex-tesoureiro da AMEA, e uma das figuras mais queridas do Club da Cruz de Malta”[2].
Em dezembro de 1932 a Seleção Brasileira foi disputar a Copa Rio Branco no Uruguai. Mesmo enfrentando o boicote dos paulistas, formando um time de desconhecidos e a pressão para não escalar Leônidas, o Brasil consegue vencer os uruguaios  por 2 a 0, com 2 gols de Leônidas.
Ao voltar para o Brasil, os jogadores foram recebidos como verdadeiros heróis, pois tinham vencido a seleção bicampeã olímpica (1924 e 1928) e atual campeã do mundo de 1930, quando muitos esperavam um resultado adverso.  “E foi uma recepção digna de heróis no cais do porto carioca. Milhares de pessoas aguardavam os jogadores para uma festa fabulosa (...) a polícia teve ate de montar um cordão de isolamento, tamanho era o delírio dos torcedores (...) do porto os jogadores seguiram em carro aberto e desfilaram pelas ruas do Rio. Era  gente por todos os cantos. Da janela dos prédios chovia papel picado, nas ruas era um só grito:  Brasil! Brasil!” (Ribeiro, 1999, p.50).
O próprio presidente Getúlio Vargas fez questão de receber e homenagear os jogadores no Palácio do Catete. Aquela seria a primeira vez que o político perceberia a força do futebol e a importância dos jogadores como novos heróis nacionais. Juntar sua imagem com aqueles heróis populares vai ser sua marca nos próximos anos.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Diário de Notícias 14 de Fevereiro de 1932.
[2] Fonte: Jornal dos Sports 01 de Julho de 1932

Vasco Jornal dos Sports 1932

Vasco Jornal Diário de Notícias 1932

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1931 1,2,3,4,5,6 E 7

  “Russinho! Russinho! Russinho!”
       Torcida grito o nome do ídolo
1931                        1,2,3,4,5,6 e 7

        Um jornal esportivo que marcaria o futebol carioca acabava de ser lançado no começo deste ano. Era o Jornal dos Sports que, em março de 1931, começava a circular pela cidade e logo se tornaria uma referência para os torcedores. Seu primeiro dono não foi Mario Filho, como muitos pensam. Seu proprietário era o empresário Argemiro Bulcão que contratou Mario Filho para ser um dos editores.
            Mario Filho foi um dos responsáveis pelas transformações que se operavam no futebol dos anos 1930, sendo um dos mais importantes líderes na imprensa na campanha de tornar o futebol profissional. Atento ao desenvolvimento dos meios de comunicação em todo o mundo, o jornalista acompanhava o crescente interesse do público consumir notícias esportivas nos países europeus e nos países vizinhos (Argentina e Uruguai). Lá os jornais já desempenhavam um importante papel de promoção do espetáculo esportivo transformando-os em grandes espetáculos de massa.
          A excursão vitoriosa do Paulistano pela Europa em 1925 ainda estava na memória dos torcedores e dirigentes do Velho Mundo com o estilo brasileiro de jogar futebol. Na mesma época os clubes e as seleções da Argentina e Uruguai também foram para a Europa e realizaram muitas proezas em campo. O resultado disso é que o futebol europeu passou a olhar o futebol sul-americano com outros olhos e começou a levar os maiores ídolos para os clubes do velho continente.
            Os clubes uruguaios e argentinos deixaram de viajar e trataram de iniciar um processo de profissionalização antes que muitos jogadores abandonassem os seus países. É nesse contexto de profundas transformações no futebol mundial e brasileiro que o Vasco embarca para a Europa para uma grande excursão, sendo o primeiro time carioca a realizar tal empreitada.
            O Vasco jogou 12 partidas em Portugal e na Espanha, de junho a agosto, tendo obtido 8 vitórias, 1 empate e 3 derrotas, com 45 gols e 18 contra, resultados que beneficiaram a fama ascendente do futebol brasileiro. No entanto, ao regressar ao Brasil, dois dos maiores ídolos não retornavam ao clube seduzidos com as propostas do exterior: Fausto e Jaguaré.
A torcida reclamou e não quis saber naquele momento que o clube ganhava uma reputação internacional de grande valor para os próximos anos. O que os cruzmaltinos queriam era o título carioca e ele não veio. O Vasco deixou escapar o titulo do campeonato em 1931 nas últimas rodadas, assim como ocorreu em 1930. Mesmo favorito desde o início da competição e com um ponto de vantagem sobre o América na última rodada, o Vasco perde em São Januário para o Botafogo por 3 a 0. Simultaneamente, o América derrotou em seu campo o Bonsucesso por 3 a 1 e levanta a taça.
A torcida não acreditava que o clube que em abril aplicava uma goleada histórica sobre o Flamengo por 7 a 0 e tinha os melhores jogadores da cidade, deixasse escapar o título que todos julgavam como certo.
Naquele mesmo ano em maio, antes da viagem para a Europa, Vasco e Fluminense em São Januário faziam uma partida que entraria para a história, não pelo o que acontecia em campo, mas por ser a primeira partida no Brasil a contar com uma transmissão radiofônica direto do estádio na íntegra. Antes as partidas eram transmitidas mas apenas nos intervalos dos programas e se resumiam a relatos dos principais acontecimentos. O rádio esportivo dava os seus primeiros passos numa época em que ainda era proibida a propaganda comercial. No ano seguinte quando o rádio começa a receber propagandas, sua programação mudará completamente. Os jogos de futebol passam a ser uma das maiores atrações, junto de programas de calouros, radionovelas, noticiários e programas de variedades. No entanto, a reação inicial dos clubes foi proibir as transmissões esportivas alegando que o rádio tirava público do estádio. Esta visão seria transformada em meados dos anos 1930 quando o rádio passa a ser o principal meio de comunicação para a massificação do futebol. E, ao contrário do que pensavam os dirigentes da época, só fez aumentar o público e transformar os clubes cariocas em clubes nacionais, em virtude das principais estações de rádio estarem na cidade,
            Tanto o rádio como a imprensa escrita foram fundamentais para acirrar os ânimos entre cariocas e paulistas que disputavam o campeonato de seleções estaduais em setembro de 1931. Em São Januário mais de 50.000 pessoas foram acompanhar a partida decisiva para conhecer o novo campeão brasileiro. A vitória dos cariocas terminou com uma grande euforia com os torcedores invadindo o gramado e carregando os jogadores em triunfo. Antes disso, eles já demonstravam sua opinião exigindo a presença do jovem jogador do Bonsucesso e grande revelação do futebol carioca de 1931, Leônidas da Silva: “os torcedores já em pé nas arquibancadas de São Januário gritavam o nome de Leônidas” (Ribeiro, 1999, p.23).
            Uma semana antes o Brasil, com uma seleção formada por jogadores cariocas, jogava contra o Uruguai (atual campeão do mundo) no estádio das Laranjeiras e vencia por 2 a 0, conquistando a Copa Rio Branco.
Enquanto Leônidas “estourou” no futebol em 1931, outro jogador que ganhava fama internacional nestas partidas era o zagueiro Domingos da Guia, que seria contratado pelo Vasco em 1932. Ele que fez sua estréia no Bangu em 1929, com 17 anos, já era considerado um astro do futebol carioca em 1930, com atuações destacadas pela imprensa.
Nascidos quase no mesmo ano (Domingos em 1911 e Leônidas em 1913), ambos enfrentaram os dilemas na mudança do amadorismo para o profissionalismo, enfrentaram o preconceito social e começaram suas carreiras em clubes pequenos: Domingos (Bangu) e Leônidas (Bonsucesso).
Embora no futuro fossem identificados como craques que marcaram o Flamengo, tanto Leônidas como Domingos da Guia passaram por vários clubes ao longo dos anos 1930 e 1940. O atacante jogou no Sírio, Bonsucesso, Penarol, Vasco, Botafogo, Flamengo e São Paulo. O zagueiro defendeu o Bangu, Vasco, Nacional, Vasco, Flamengo e Corinthians.
            Para os jogadores a mudança de clube poderia ser traumática, como relembra Domingos da Guia numa entrevista ao jornal Última Hora em 1957: “no amadorismo, quando o jogador mudava de time era o fim do mundo. Ele passava a ser apontado na rua como um miserável traidor. E havia os exagerados, que cuspiam a sua passagem, num esgar medonho de nojo. Em suma mudar de clube era uma coisa mais ignóbil que um adultério. Aquele que por qualquer motivo, trocava de camisa, era chamado de borboleta. Mas esse nome bonito lírico, não disfarçava a ofensa mortal. O craque chamado de borboleta rugia de humilhação e de remorso” (Hamilton, 2005. p. 86).
Mudar de time não era muito aceito pelos torcedores nesta época. O jogador sabia que teria problemas com os  torcedores do seu antigo clube. Basta lembrar o que ocorreu com o jogador Penaforte ao trocar o Flamengo pelo América em 1927. Depois de vencer o  América na final do campeonato carioca do mesmo ano, o Flamengo e sua torcida organizaram uma passeata para enterrar o zagueiro Penaforte. A passeata terminaria diante da própria sede do América. Na ocasião, acabou ocorrendo uma briga generalizada entre os torcedores do América e do Flamengo.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.

Vasco Jornal Diário da Noite 1931




domingo, 11 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1930 CONCURSO LEVA UM TORCEDOR A COPA

“mulato majestoso e bem vestido” descrição de Polar
           
1930            Concurso leva um torcedor a Copa

Os anos 1930 começam com a expectativa geral dos torcedores na primeira Copa da Mundo de Futebol a ser disputada no Uruguai, país vencedor do futebol nas Olimpíadas de 1924 e 1928. A seleção brasileira se preparava para enfrentar os seus adversários com os principais jogadores do país. Entretanto, acabou viajando desfalcada dos jogadores de São Paulo, pois ocorreu em junho uma crise entre a federação paulista e a CBD (entidade sediada no RJ) e o nosso time foi formado praticamente por jogadores da capital federal, a cidade do Rio de Janeiro. Do Vasco foram convocados Itália, Fausto, Russinho e Tinoco.
O jogador mais famoso do futebol brasileiro dos anos 1910 e 20, o atacante Friedenreich, foi um dos atletas que não puderam participar do campeonato mundial. Ele que foi uma das atrações no jogo amistoso entre o seu novo time, o São Paulo e o Vasco em São Januário. “Fried é o alvo de manifestações calorosas da torcida carioca (...) marcaria de cabeça o gol de honra do tricolor na derrota por 2 a 1” (Duarte, 2012, 195-196). Este seria o primeiro gol do atacante, na primeira partida ao artilheiro contra o Vasco.
Com a seleção brasileira de 1930 repleta de jogadores vascaínos, uma emoção febril tomou conta dos estádios em cada partida disputada entre os maiores clubes da cidade. O jornalista Álvaro Moreira (pai do famoso cronista esportivo dos anos 1960, 70 e 80, Sandro Moreira) escreveu uma crônica em estilo telegráfico o incentivo das torcidas: “o clássico entre Vasco e Fluminense num estádio cheio, cheio, cheio. De lado a lado a participação da torcida é intensa. Começa a torcida eh...eh...eh.... A cada ataque adversário torcedores provocam seus adversários...Uh...Uh...Uh...Fluminense! E continua a disputa nas arquibancadas para ver qual era a torcida mais animada. Palmas com as mãos e com os pés, palmas, guinchos, assobios, delírio. Fim do jogo um 0 a 0 em campo, mas na arquibancada o jogo continua. Cada lado grita o nome de seus jogadores principais. Vasco! Jaguaré! Fortes! Russinho! Fluminense! Os nomes dos clubes e dos jogadores esparramaram-se no ar como confetes sincronizados” (Pedrosa, 1968, p.132-133).
Enquanto a imprensa paulista boicotava a seleção nacional e incentivava os paulistanos torcerem contra o Brasil, o jornalismo carioca dava total apoio aos jogadores, promovendo uma campanha inédita através do diário “A Crítica” para levar um torcedor para o Uruguai como representante da torcida brasileira. Pelo Vasco, concorreram vários torcedores conhecidos no clube, sendo o mais votado Polar, com 90.000 votos, outros torcedores que também concorreram foram Ítalo Saine, o “Loló”, Jayme Silva, J. Correa de Araujo, Armando Tavares de Oliveira e Elyseu Coelho.
O jornal “A Crítica” era de Mario Rodrigues e sofreu uma grande perda naquele tempo com a morte do seu dono. Em seu lugar assumiram os filhos, entre eles, Mário Filho, um dos maiores incentivadores da participação ativa das torcidas e uma figura que se tornaria central para o desenvolvimento do jornalismo esportivo nesta década.
Outro jornal que promoveu uma imensa campanha foi o Diário da Noite em parceria com uma empresa de cigarros para eleger o jogador mais popular do Brasil. Cada clube podia indicar um candidato. O Vasco indicou o atacante Russinho. O pesquisador João Malaia Casquinha apresenta os números impressionantes do concurso: “durante o mês de maio, o número de carteiras contabilizadas era tão alto, que o periódico que patrocinou o concurso chegou a afirmar que os cariocas se envolviam mais na escolha do maior footballer do país do que na eleição para presidente, entre Julio Prestes e Getúlio Vargas. Realmente, os números finais do concurso dão uma ideia do que foi aquele pleito. Russinho ficou em primeiro lugar, com 2.900.649 votos. Fortes foi o segundo, com 2.048.483 votos, seguido por Filó, com 722.563, Friedenreich, com 319.050 e por Nonô, com 129.890. No total, seis milhões de carteiras de cigarros”.
Dentre os vários  jogadores vascaínos que participaram da primeira Copa do Mundo no Uruguai, Fausto foi o que obteve as maiores glórias, recebendo da imprensa uruguaia o apelido de "Maravilha Negra". Com o seu estilo elegante, exímio controle de bola e passes longos, Fausto foi o primeiro de uma escola brasileira de jogadores de talento indiscutível.
Na volta ao Brasil, os jogadores vascaínos se incorporam ao elenco para o campeonato carioca. Mesmo fazendo uma boa campanha, o Vasco perde o título na última rodada com uma derrota surpreendente para o modesto time do Sírio do zagueiro Aragão. Após o jogo, surge um boato que o clube recebeu um premio extra de 500 mil reis oferecido pelo Botafogo, interessado na derrota do Vasco. Aragão quebrou quase todo o time do Vasco, que perdeu o jogo e a chance de chegar ao bicampeonato.
Se oferecer dinheiro para jogadores quebrarem seus adversários era uma prática que existia, uma outra atitude desonesta já permeava o universo do futebol. Já era comum a evasão de renda com a entrada de diversas pessoas sem pagar ingressos nos estádios. Um prejuízo que saía caro para os cofres dos clubes que, prestes a ingressarem no profissionalismo, viam suas receitas com o futebol saírem pelo ralo. Foi pensando nisto que o Vasco designou o torcedor símbolo dos anos 1920, José Paradantas, para fiscalizar as bilheterias em São Januário  e também formou várias comissões de associados para a fiscalização dos portões do Estádio[1].
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.



[1] Fonte: Diário de Notícias 16 de Novembro de 1930.

Vasco Jornal Crítica 1930

Vasco Revista Lusitania 1930


quarta-feira, 7 de setembro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1929 O PRIMEIRO ESQUADRÃO

“El Tigre Carioca”
Russinho- chamado pela imprensa

1929                    O Primeiro Esquadrão

Uma final entre Vasco e América nos dias atuais seria praticamente uma decisão com uma única torcida. Nos anos 1920 a situação era bem diferente. Os rubros apesar de ser a 5ª torcida da cidade tinham um grande apelo popular e conseguiram dividir com os vascaínos o estádio das Laranjeiras nos três jogos decisivos entre os dois times. Para acompanhar o movimento das torcidas o jornal Crítica de Mário Rodrigues fez uma enquete com os torcedores sobre o palpite de cada um sobre o resultado da final.
O jornal “Crítica” surge no final de 1928 quando o jornalista perde o controle de seu ex-jornal “A Manhã” para o seu sócio Antonio Faustino Porto. O periódico tinha na chefia da redação esportiva, o jovem Mário Filho e um dos repórteres esportivos era Nelson Rodrigues, ambos filhos de Mário Rodrigues. O diário da família Rodrigues é lançado em novembro de 1928 e logo vira um sucesso de vendas, concorrendo com mais de 20 diários em 1929.
Com o apoio do vice-presidente da Republica, Melo Viana, o jornal adota uma linha de sensacionalismo policial, cobertura política de forma polêmica e uma abordagem diferente da reportagem esportiva da época com mais destaque para fotos dos jogadores sem terno e gravata, se exercitando durante os treinos, entrevistas mais profundas com os atletas e repercutindo as discussões dos torcedores nas vésperas de jogos importantes.
No dia anterior da decisão do campeonato de 1929 uma página inteira do jornal é dedicada a ouvir a opinião dos torcedores. Intitulada “Quem vencerá? América ou Vasco?”, dezenas de torcedores dão o seu palpite. Em cada depoimento é possível traçar um breve panorama das discussões futebolísticas no final dos anos 1920. Em muitas expressões dos torcedores dá para perceber como eram aqueles últimos anos de amadorismo, quais os principais ídolos e as características das duas torcidas. Certas gírias, palavras e gozações são incompreensíveis para quem não viveu aquele momento. Para dizer que a partida era fácil eles usavam “O Vasco vai ser sopa”, “o Vasco vai sapecar 3 a 1”, “o Vasco vai ensopar o América”, “o América é canja” ou a previsão de brigas “vai ter muito sururu”, e muitas apostas “quem quiser apostar comigo que me procure” afirmava um torcedor que dizia o placar e dava o seu endereço. As expressões em inglês ainda eram comuns: “o match de domingo” ou “o sportamn aposta no clube de seu coração”, e a ainda atual: “Americano roxo”.
 O jornal afirmava ter 100 mil leitores e promoveu os prognósticos da partida por telefone e por meio de cartas e bilhetes que os torcedores entregavam na redação do jornal no centro da cidade. Outras expressões coletadas: “os diabos rubros”, eu só quero ver a choradeira copiosa do Fontainha”, “o América vencerá se o Vasco não adotar o sistema da tourada”, “o estrilho dos americanos vai ser monstro”, “um vascaíno fuzarqueiro”, “vai fazer um candomblé para seu América vencer”, “uma torcida americana renitente”, “um americano de classe para a pugna de amanhã” , “é vascaína “rubra”, “diz a quatro ventos que seu clube vencerá”.
O placar final terminou com uma vitória por 5 a 0 para o Vasco e muita polêmica nos anos seguintes, com a acusação do jogador Floriano (América) ter entregue o jogo. O próprio jogador escreverá um livro depois se defendendo e fazendo uma série de denúncias sobre os tempos de futebol amador.
Nestes últimos anos antes do profissionalismo os maiores vencedores nos anos 1920 no futebol carioca foram os clubes da zona norte. Entre 1922 e 1929 os suburbanos ficaram com 5 títulos, enquanto as equipes da zona sul conquistaram três campeonatos (1924, 1925 e 1927). Em 1928 e 1929 os dois primeiros colocados eram da zona norte: Vasco e América. Ambos conseguiam lotar os estádios e comprovar que a realidade do futebol neste fim de década era bem diferente da anterior que teve a supremacia inegável dos clubes da zona sul, área mais rica da cidade.
Mario Filho (2003, p.170) relembra como foram os 3 jogos decisivos neste ano no estádio das Laranjeiras. em novembro: “o estádio do Fluminense transbordando no primeiro, no segundo, no terceiro jogo, cada vez mais gente. Era América e Vasco, todo mundo queria ver. O rumor da multidão, oceânico, chegava até o vestiário, parecia que estavam forçando as portas de ferro”.
No entanto prevalecia uma imagem de torcedor da zona norte como violento e que os estádios desta região como locais perigosos. Este juízo foi construído pelos jornais e torcedores da zona sul, que mesmo possuindo estádios em condições semelhantes (com exceção do Fluminense) chamavam os estádios da zona norte de “galinheiros”,
O próprio Mario Filho em seu livro mais famoso, ao retratar a conquista do São Cristóvão em 1926, passa a relatar o que era disputar um jogo no campo do alvinegro da zona norte: “Quem entrava em Figueira de Melo tinha de sair pelo corredor, os torcedores do São Cristóvão de um lado e de outro, brandindo bengalas e pedaços de pau (...) os brancos dos outros clubes recebiam cachações na geral, na arquibancada, no corredor de saída, corria até o risco de levar uma navalhada” (2003, p.151-152).
No revista teatral “É da fuzarca” de 1928, temos um outro exemplo do preconceito com uma letra de música chama atenção para o medo que causava enfrentar um clube no subúrbio: “Futebol é um esporte que provoca sururu/ Eu sou lá da zona norte e torcida do Bangu”.
Bem diferente era uma outra opinião da torcida do Vasco sobre aquele período e o elenco de 1929. O pesquisador cruzmaltino Mauro Prais relata no site Netvasco uma informação de Maurício Wanderley, um antigo vascaíno sobre o time, conhecido como o primeiro esquadrão vascaíno e lembrado por muitas gerações com uma escalação que os mais velhos sabiam de cor: “tinha 9 anos e já torcia para o Vasco. O time era este mesmo. E é sobre isto que gostaria de levar ao seu conhecimento - talvez você não saiba. Nós, meninos da época, discutindo com outros colegas sobre futebol, times, torcidas, etc., fazíamos o seguinte comentário (que fazia qualquer um calar a boca) e que os outros meninos não podiam comentar coisa alguma depois de ouvir: JAGUARÉ foi na ITÁLIA comprar BRILHANTE. Assistiu com TINOCO a ópera FAUSTO, sentado numa cadeira de MOLA. Na volta, PASCHOAL encontrou OITENTA E QUATRO RUSSINHOS junto com MÁRIO MATOS na Igreja de SANTANA."
 Aos poucos o clube ia transformando seu estádio com várias instalações para dar mais conforto e comodidade para seus torcedores, como a “INAUGURAÇÃO DO SALÃO DO RESTAURANTE DE SÃO JANUÁRIO. Acaba de ser inaugurado o luxuoso restaurant do Stadium do Club Vasco da Gama. É mais um melhoramento na importantíssima sociedade, que é uma das maiores da América e um padrão de glória dos nossos compatriotas, que são, como se sabe, os seus mais fortes esteios. A nossa gravura apresenta um aspecto tomado após a inauguração, vendo-se a directoria (sentada) e, em pé, os representantes da imprensa e cronistas esportivos, presentes a cerimônia”[1].
O final dos anos 1920 termina com mais um título do remo para o Vasco, conquistando o tricampeonato (1927-28-29). Em toda a década este era o quinto título. O clube seguia dominando no ranking como o maior vencedor nas regatas. Confirmando o título de “Campeão na terra e mar”.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Revista Lusitania 16 de Agosto de 1929.

Vasco Revista Lusitania 1929

Vasco Revista O Malho 1929