Já se tornou característico, em todos os jogos de que o Vasco participe, ouvir-se aquela corneta, inconfundível, incentivando os jogadores cruzmaltinos à vitória. Às vezes, o toque da corneta age como uma "guerra de nervos" contra a torcida adversária e a reação não se faz esperar...
Sempre houve curiosidade, por parte dos torcedores,
em conhecer o corneteiro, que outrora "tocava" que
outro se não, Domingos do
Espírito Santo Ramalho. Hoje, já aposentado, sem intimidade e só um homem
pobre, com esposa e seis filhos, sua aparência está em consonância com sua
condição — ex-árduo trabalhador nas estivas do Cais do Porto.
“Seu” Ramalho recebeu a R.E. na sua humilde
moradia, na favela de Vasco. “Não se incomodem, aqui os meninos não haviam
mesmo de sair, uns quatro vascaínos do Vasco em quantidade. Os meninos correm
pela casa, brincando, vestidos com a camiseta cruzmaltina, com a qual Ramalho
seria, feliz.
— Desde quando você toca sua mamona, Ramalho?
— Desde garoto. Nasci de oito mês... quando, lá em
Inhaúma, em dezembro de 1921, brincava com os meninos de rua. Naquele tempo, a
gente costumava imitar os foguistas dos navios. A gente morava, bem ao lado do
2º B.C. da Polícia Militar. De tanto ouvir o corneteiro do quartel dar aqueles
toques, acabei aprendendo a ponto de ainda tocar melhor do que ele.
NEM POR UM MILHÃO TOCARIA MAMONA PARA OUTRO CLUBE
[...] que ele. Como chefiava a garotada, inventei a
brincadeira de “Tiro de Guerra”: dava os toques e a meninada executava minhas
ordens. Um dia, o comandante do Quartel, Cel. Alfredo Coelho, mandou-me cabra
até minha casa a fim de buscar o “corneteiro”. Tendo à presença dele, o
Comandante exigiu que eu tocasse, diante de todo o batalhão formado, julgado no
pátio do interior do quartel. Toquei. Ele achou muita graça, colocou um
branquinha ali da camarada de banda, e me pôs a ajudar os tambores, nas formaturas
e nos exercícios. [...]
Aqui cabem alguns dados pessoais sobre essa figura
simpática, eminentemente popular, admirador dos desportistas vascaínos: Ramalho
é casado e tem 6 filhos. Resultaram seis filhos: Maria de Lourdes, Nanci Maria
da Luz, Luís, Valter (em homenagem às grandes direitas do Vasco) e Tereza
Herrera (em homenagem ao espanhol Tereza Herrera e Vasco conquistou na
Espanha).
Sabe o José, há um aspecto interessante (aconteceu
Ramalho), um dia em que jogava o Vasco e o seu Ramalho. Ademir disse ao
Ramalho: “Vou te ensinar a bater na bola, rapaz, pois você só faz barulho com
esse tubo de mamona.” Ademir disse isso em tom de brincadeira, e riram bastante
os dois. Ramalho conserva, com prazer, uma bola passada, suja, assinada por
todos os jogadores cruzmaltinos. [...]
— Como foi que você se tornou vascaíno?
— Por causa de um rapaz amigo meu, que era foguista
de um navio do Lóide. Ele se chamava Aníbal Bene e seu apelido era “Sir”. Pois
bem: “Sir”, sem que voltava do Rio, me trazia uma lembrança qualquer do time do
Vasco. Num dia, me deu uma camisa preta com uma cruz de cimento. Tinha fé no
meu gosto, achava que eu seria vascaíno, mesmo sem nunca ter visto...
— Quando foi que você tocou para o Vasco, pela
primeira vez?
— Estava no Rio há pouco, pois viera tentar a sorte
na “Cidade Maravilhosa”. Arranjei um emprego na portaria da Rádio Mayrink
Veiga, e José Hermano me convidou. Um dia fui a São Januário assistir uma
partida entre o Vasco e o Botafogo, que, aliás, foi goleado pelo time, por 3 x
1, só de Ademir!
Quando o Vasco festejou seu aniversário, em 1946,
fui convidado para tocar. No gramado, onde estavam os jogadores, e o busto da
Cruz de Malta, levantei o meu clarim e toquei com mais força, tamanha era minha
emoção. Nesse momento, dois homens me levaram ao vestiário do Vasco...
— E o senhor se tornou sócio do Vasco?
— Sim. Fui à secretaria e matriculei a 25.846 da
associação. Em 1923, Eurico Lisboa me fez sócio remido, por consideração.
Depois vieram Antônio Soares Calçada, Eurico Alves e agora o Sr. Barreira, que
me estimam tanto, que me têm em muita consideração. Para mim, é uma grande
honra ser vascaíno, porque esse é um dos títulos dos dirigentes do clube.
— Você tocaria por outro clube?
— Nem pensar! Já bati no espanhol umas trinta
vezes!
— E se lhe dessem um milhão?
— Sou pobre, mas jamais aceitaria tocar essa mamona
para outro clube, especialmente contra o Vasco. O dinheiro se consome, morre,
mas a glória de servir Nosso Senhor Vasco da Gama, essa não morre nunca! Nunca
aceitaria. Jamais trairia esse grande querido Vasco!
Fonte: Revista do Esporte 1959, fotos
Memória do Torcedor Vascaíno, Jorge Medeiros
TOV Domingos Ramalho Revista do Esporte 1959 |
TOV Domingos Ramalho Revista do Esporte 1959 |
TOV Domingos Ramalho Revista do Esporte 1959 |
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