“ A História do Vasco deveria ser ensinada nas escolas”
Luiz Antônio
Simas, escritor
UM
VÍRUS NOS ESTÁDIOS
Para renovar o elenco desta temporada o presidente do Vasco
Alexandre Campello contratou o atacante argentino German Cano que foi recebido
com uma grande festa pela torcida no aeroporto. Entretanto, o futebol deste
fatídico ano teve como problema maior derrotar outro inimigo que enfrentaríamos
fora das quatro linhas. O vírus que surgiu na China no fim de 2019 parecia uma
ameaça pouco remota. Parecia ...
Para arrumar o time nossos problemas começaram com saída do
técnico Wanderley Luxemburgo que havia conseguido dar um padrão de jogo ao time
no ano anterior. Para o seu lugar assumiu Abel Braga que não arrumou um time
equilibrado e logo nas primeiras rodadas revoltou a torcida ao declarar após a
derrota para o Flamengo na Taça Guanabara que “o jogo foi lindo”. Logo
começaram os protestos em campo e nas redes sociais, o técnico Abel tentou
minimizar o fato: “A torcida me conhece bem. O torcedor é soberano. Problema
zero. Eu gosto dessa torcida porque quando joguei aqui, com essa camisa, a
minha alma ficava lá. Estou tentando fazer isso com esse time".
As derrotas e o desempenho pífio do ataque vascaíno
provocaram a derrubada de Abel ainda em fevereiro. Neste início de caminhada
somente dava para comemorar as realizações de fora das quatro linhas. Uma delas
foi o primeiro desfila da União Cruzmaltina. Formada por vários integrantes das
torcidas, a agremiação carnavalesca desfilou no Na Intendente Magalhães no
Grupo de Avaliação. Outro fato marcante foi a comemoração dos 50 anos de
fundação da Força Jovem do Vasco (1970-2020), completado no dia 19 de fevereiro.
Apesar de afastada dos estádios (proibida pelas leis desde 2014), vários
integrantes fizeram questão de reverenciar a maior torcida organizada do clube
durante vários anos.
Entrou o mês de março e a torcida deu uma grande manifestação
de apoio ao clube comparecendo mais de 30 mil pessoas no estádio do Maracanã no
jogo contra o ABC válido pela 2ª rodada da Copa do Brasil. Na semana seguinte,
agora em São Januário, o Vasco era derrotado pelo Goiás na 3° rodada e os alvos
só aumentaram contra Abel e o presidente Campelo. Mas as notícias de uma
pandemia mundial se aproximando do país eram cada vez mais evidentes. No dia 13
de março já era uma realidade que o Brasil entrava na rota definitiva da Covid.
Com a paralisação de várias atividades econômicas e a
proibição de aglomerações, as praças esportivas tiveram que ser fechadas por um
bom tempo. Não foi um momento tranquilo para ninguém, a cada dia um amigo, um
conhecido ou parente era internado. Muitos não resistiram. Entre eles estavam
famosos vascaínos, como o escritor Rubem Fonseca. (falecido em 15 de abril) e
depois o músico Aldir Blanc (morte em 4 de maio).
Nas redes sociais os torcedores se mobilizam para ajudar os
mais necessitados que perdiam os seus empregos. Até mesmo e ex-presidente da
república Lula, através da internet pede para os torcedores vascaínos ajudarem
aos ambulantes do estádio de São Januário, fruto de uma campanha promovida pala
cantora vascaína Teresa Cristina.
Em maio, o destaque foi a exibição na Rede Globo da conquista
da Taça Libertadores em 1998, com grande audiência, os torcedores mataram
saudade de um time e uma época que o Vasco dominou o futebol sul-americano.
Apesar de vários protestos de grupos de torcedores no Rio de
Janeiro e em São Paulo, que inclusive ocuparam as ruas unindo torcidas rivais,
o futebol voltou em julho. No primeiro jogo depois das paralisações, na
continuação do campeonato carioca os jogadores do Vasco se unem aos jogadores
do Macaé e fazem um protesto lembrando o assassinato de um negro americano que
mobilizou o mundo inteiro. Os jogadores se ajoelham juntos ao redor do grande
círculo para lembrar dos protestos intitulados “Vidas Negras Importam”.
Após a péssima campanha no campeonato carioca, o Vasco
contrata o ex-jogador Ramon Menezes para comandar o time para a Copa do Brasil
e para o nacional de 2020. No início de agosto mesmo com um número elevado de
novas infecções e mortes por causa da pandemia os clubes se prepararam para o
campeonato Brasileiro. E foi neste mês que o Vasco viveu seu melhor momento no
ano. A primeira boa notícia foi a recuperação do ex-médico Clóvis Munoz curado
da doença. Ainda neste período o clube alcança bons resultados e assume a ponta
do campeonato nacional (algo que não acontecia desde 2012). Também neste
período é lançado o livro do geógrafo Leandro Fontes: “Vasco, o clube do Povo”.
Ainda nesta época o presidente Alexandre Campelo anuncia um audacioso e
polêmico projeto de reestruturação de São Januário, transformando o estádio em
modernidade e aumentado a sua capacidade para 45 mil pessoas.
Com os torcedores impedidos de se reunirem nos estádios
restava como novas alternativas os canais da internet e suas lives. Era o
torcedor mantendo acesa a sua paixão através dos criativos formatos de
acompanhar o futebol que não fosse através de sua presença no estádio. Aliás,
as transmissões esportivas contaram com um apoio marcante de DJs em todos os
campos esportivos que utilizavam os sons dos “gritos de guerra” das suas
respectivas torcidas. Em São Januário, não foi diferente e assim era possível matar
a saudade e fingir que o campo estava repleto de torcedores. Mas a realidade é
que o lamento do “novo tempo” era o sentimento mais frequente. Como lembra o
casal de vascaínos Mauro Araujo e Carolina Santos: “nunca ficamos tanto tempo
longe de São Januário. Oito meses parece uma eternidade”, reclama o casal pela
internet.
E foi pelas redes sociais que o torcedor se reinventou com a
ampliação de “lives” e grupos de WhatsApp que se proliferaram neste momento. E
a temática se concentrava na péssima campanha do time em outubro e novembro e
na disputa acirrada pela presidência do clube. Três foram os principais
adversários que dividiram as atenções dos torcedores. Leven Siano (Somamos)
Jorge Salgado (Mais Vasco) e Júlio Brant (Sempre Vasco) trocaram muitas
acusações entre si mostrando que a paz no ambiente político do clube estava
longe. Inicialmente a vitória ficou com Leven Siano que venceu no dia 07 de
novembro com votação presencial. Mas em seguida os derrotados apelam para a
Justiça que remarcou para 14 de novembro.
O mês de dezembro foi tenso para os vascaínos com a
indefinição da eleição para presidente do clube, a péssima campanha do time no
campeonato nacional ficando na zona de rebaixamento e aumento dos casos de
covid na cidade do Rio de Janeiro. Somente no dia 21 é que foi definido pela
Justiça que o resultado válido foi o que consagrou Jorge Salgado como novo
presidente do clube.
O ano terminou sem a torcida poder sonhar com o time se
mantendo em disputar a Serie A do campeonato nacional no ano seguinte pois o
calendário foi estendido até fevereiro de 2021. Um ano para esquecer em todos
os sentidos.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”,
escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
![]() |
Guerreiros do Almirante foto Marcelo Teobald 2020 |
![]() |
Mancha Negra O Globo 2020 |
![]() |
Guerreiros do Almirante O Lance 2020 |
Nenhum comentário:
Postar um comentário