“No tempo em que Pelé era
o Ademir”
Nelson Rodrigues
1955 Adeus Ademir
Em meados da década de 1950 era
possível observar algumas mudanças sutis no futebol brasileiro provocado por
vários fatores. A primeira alteração foi o crescimento da TV como meio de
comunicação nesta década e o início da transmissões esportivas ao vivo. Outra
variação foi a perda da importância das disputas entre paulistas e cariocas,
principalmente entre os selecionados. Esta era a competição que mais envolvia
torcida nos anos 1940.
A entrada da TV no futebol, não
substituiu a força do rádio nos anos 1950 nem tirou o público dos estádios. No
entanto, o crescimento da TV era inegável. Basta considerarmos a evolução da TV
no Brasil: em 1956, havia 70.000 aparelhos. Este número multiplicou em 1960,
saltando para 1.200.000, sendo que no Rio de Janeiro havia 230.000 aparelhos.
Apesar desse crescimento, prevalecia a necessidade de assistir a TV na casa de
um vizinho mais abastado.
O alcance do rádio carioca em todo o
Brasil fazia dos clubes da cidade verdadeiros times nacionais. O poeta Ferreira
Gullar lembra que em sua infância mesmo não sendo um torcedor fanático tinha
entre suas predileções a adesão ao clube da capital: “não sou torcedor
apaixonado. Sou Vasco desde os doze anos, quando pus o nome de Vasco em meu
time de botão. Isso em São Luís do Maranhão; portanto, nunca tinha visto o
Vasco jogar, mas sabia de cor a escalação do time”.
Outro meio de comunicação bastante
popular nos anos 1950 era o cinema, mas poucos filmes tinham o futebol como seu
tema principal. Em 1955, o cineasta Nelson Pereira dos Santos realiza Rio,
40 graus, filme que faz um panorama da sociedade carioca e que, entre os
seus personagens principais, estão os torcedores. No filme o futebol
desencadeia paixão e sentimentos controversos. Em algumas cenas filmadas no
Maracanã, é possível entender o que o futebol representava na época para os
cariocas. As diversas imagens encenadas nas arquibancadas, cadeiras e gerais
mostram a torcida em vários ângulos, desde os mais abertos até os mais fechados
com as expressões faciais demonstrando as alegrias e os sofrimentos. Pode-se notar que
os torcedores estão trajando roupas mais simples e não usam o terno e a gravata
(vestimentas comuns até os anos 1940), os únicos que usam estas roupas são os
dirigentes que se localizam nas cadeiras especiais. Em todo o jogo é profunda a
interação da torcida com o desenrolar da partida, há xingamentos ao juiz,
discussões, vaias, briga na geral, aplausos, bandeiras, fogos e a presença do
rádio de pilha acompanhando os torcedores nos estádios (uma novidade para a
época e marca registrada nos anos seguintes).
Na
competição do torneio Rio-São Paulo, a hegemonia dos paulistas foi total nesta
época. Só perdendo dois campeonatos (Fluminense em 1957 e Vasco em 1958). O mesmo
acontecia com a seleção paulista[1] que venceria a carioca em
muitas oportunidades. A verdade é que a disputa entre paulistas e cariocas foi
deixada de lado pelos cariocas, enquanto os paulistas faziam questão de
continuar medindo forças contra os cariocas.
E
foi assistindo o brilhante atacante paulista jogando, Valter Marciano, que o
Vasco resolveu contratá-lo do Santos neste ano. O jogador vai ser o grande
destaque no título carioca de 1956 e o maior nome do jogo com o Real Madrid em
1957. Suas grandes atuações na Europa acabaram despertando o interesse do
Valência da Espanha que o contrata no mesmo ano.
Esta
década consagrou o futebol brasileiro como artigo de exportação. Nunca os
jogadores e os times nacionais jogaram tanto pelo mundo afora. O lugar mais
visitado era a América do Sul. Antes dos anos 1950 o Vasco só havia feito duas
excursões para a Europa. Neste decênio foram várias vezes. Nesse ano de 1955 o
clube ficou mais de dois meses fora do Brasil. No ano seguinte foram quase
quatro meses viajando para vários países. A experiência internacional deu aos
jogadores maior possibilidade de conhecer os adversários europeus, porém as
condições de trabalho dos atletas (com jogos seguidos), eram desrespeitadas.
Duas figuras centrais do Expresso da
Vitória nos anos 1940 começavam a se despedir do clube. O técnico Flavio Costa
que voltara a São Januário em 1953, perdia novamente o campeonato carioca de 1955
para o Flamengo, embora o Almirante tenha sido o clube com maior número de
pontos em todos os três turnos do campeonato. Ao final da competição em 1956
Flávio era demitido e Martin Francisco assumiria o seu lugar.
Enquanto isso, o atacante Ademir
Meneses fazia seu último campeonato carioca pelo Vasco se tornando
definitivamente um dos maiores ídolos dos cruzmaltinos de todos os tempos. Por
outro lado, um outro jogador de estilo e posição bem diferente ia se firmando
como ídolo no clube. O zagueiro Bellini, com sua raça e desprendimento
conquista a cada ano o coração do torcedor. O jornalista Nelson Rodrigues
resume a importância do defensor para o clube: “não se pode imaginar um jogador
que dedique mais a um jogo, que lute e se mate tanto. E eu creio que um Vasco
sem Bellini já seria menos Vasco”.
Além
do futebol, outros esportes faziam sucesso entre os torcedores. O tradicional
remo e o atletismo deram muitos motivos de celebrações de vitórias. Em Vidas
Vascaínas (2003, p.357) o ex-remador Mario Lamosa relembra a importância deste
esporte e a paixão que ele despertava: “Na época, na década de 1950, o remo era
o segundo esporte do Brasil. Quando fizeram aquele estádio de remo na Lagoa,
você tinha, no mínimo, dez mil pessoas a sua volta. Os últimos 500 metros você
já escutava o grito da torcida”. Outro esporte que cresceu muito no Vasco foi o
atletismo, principalmente depois da chegada de Adhemar Ferreira da Silva, em
1955. O atleta que foi medalha de ouro no salto triplo em Helsinque (1952),
venceria novamente, já como atleta do Vasco, nas Olimpíadas no ano seguinte
(Melbourne).
[1] O
campeonato de seleções entrava em seu declínio, pelo menos para os cariocas. Em
vários anos, por falta de calendário, a competição não foi disputada. Entre
1951 e 1959, os paulistas venceram todas: 52, 54, 56 e 59. Já no torneio
Rio-São Paulo, o Corinthians venceu em 53 e 54, o Santos em 59, o Palmeiras em
51 e a Portuguesa em 52 e 55.
Vasco Jornal Sport Ilustrado 1955 |
Vasco Jornal O Globo 1955 |
Nenhum comentário:
Postar um comentário