“os jornais não falavam em outra coisa. Páginas e coluna
deles eram ocupadas com história de ‘matches’”
Lima Barreto, escritor
1912 Torcendo pelos Rivais
Um clube no início do século
geralmente se dedicava a alguns poucos esportes ou era criado exclusivamente
por causa de uma atividade física que tivesse mais interessados. Isso começou a
mudar com a proliferação de clubes exclusivos de futebol. Em 1912 a febre da
criação desses “clubes de football” era
uma realidade em toda a cidade do Rio de Janeiro. Neste ano era criada a Liga
Sportiva Suburbana, englobando clubes de futebol desta região da cidade. Uma
prova que o “esporte bretão” não era mais de domínio exclusivo dos clubes da
elite da Zona Sul.
O sucesso do futebol começava a ser
notado em todas as áreas. Nos estádios mais lotados, no aumento de divulgação
na imprensa e na paixão do torcedor. E este foi o ponto fulcral para os amantes
do esporte. Apesar do intenso ardor que o público acompanhava seus clubes nas
regatas, o sentimento mais aflorado já se manifestava nos gramados onde se
disputavam acirradas partidas. Era a “paixão do futebol. Era isso que assustava
o clube de remo. De tal modo que foi uma luta convencer o Flamengo a entrar
para o futebol. O Flamengo com sessenta sócios, se tanto, sem um campeonato de
remo, impôs condições, fez tudo para não ser um clube de futebol” (Mario Filho,
2003, p.54). A criação do Departamento de futebol no Flamengo (final de 1911) não
foi algo simples, pois havia um certo ciúme do setor dominante que achava que
este “modismo” poderia afastar o clube de seu esporte mais importante.
O crescente interesse pelo futebol
também continuava no Vasco por meio de seus sócios e atletas que acompanhavam
os jogos e torciam pelos seus clubes. Mas estes “torcedores de futebol do
Vasco” ainda sonhavam com a possibilidade do nosso clube competir de igual para
igual com os poderosos Fluminense, Botafogo e, a grande novidade do ano, o
Flamengo, tradicional rival das regatas, que montava seu time após
desentendimentos entre atletas do Fluminense
(campeão em 1911) e seus dirigentes. O memorialista vascaíno José da
Silva Rocha (1975) relembra a atitude contraditória dos vascaínos entre 1911 e
1916: “aos domingos, após os jogos do campeonato, muitos sócios desciam dos
bondes (...) e reuniam-se na sede de Santa Luzia comentando as peripécias dos
encontros que tinham assistido. Alguns torciam pelo Fluminense, outros pelo
Botafogo, pelo América, pelo Flamengo (...) os encontros eram aliciantes. Não
se podia assisti-los sem tomar partido por um dos grupos em luta”
Com a conquista do campeonato de
Remo de 1912, o grupo vascaíno que se opunha se tornou mais forte e coube aos
associados mais interessados na prática do futebol buscarem outras
alternativas, talvez até participando de criação de clubes de futebol pelos
seus locais de moradia ou de trabalho.
Pelo campeonato carioca de futebol
organizado pela Liga Metropolitana a vitória coube ao Payssandu, um clube da
elite carioca, formado por muitos descendentes de ingleses. Esta foi a primeira
e única conquista do grêmio. Os outros participantes foram: Mangueira, São
Cristóvão, Bangu, America e Rio Cricket.
A disputa pelo interesse da
população entre o futebol e o remo viveu momentos que ora será favorável a um,
ora o outro terá mais destaque. Por exemplo, no primeiro Fla-Flu disputado em 7
de julho de 1912, os jornais noticiavam com desalento que houve “pequena
concorrência, calculada talvez em 800 pessoas”[1]. Mas é preciso olhar com
cuidado as informações, pois nem sempre a imprensa soube representar
corretamente como a paixão do público foi mudando de esporte preferido.
No
mesmo dia do primeiro Fla-Flu era disputada uma regata organizada pelo Club
Boqueirão do Passeio, mobilizando a maior parte das atenções da imprensa. No
dia da competição estava presente o ex-presidente da Argentina Júlio Roca, que
cumpria a missão diplomática de reaproximação entre os dois países. A
importância dessa visita para o desenvolvimento do esporte no Brasil ainda não
foi estudada pelos pesquisadores. Nos próximos anos o futebol brasileiro vai
ser o maior beneficiado, com a realização de jogos entre times e selecionados
dos dois países. Em 1914, será formada a primeira seleção brasileira para
disputar a Copa Roca da Argentina. A partir daí vão se estreitar os laços entre
outros países da região para formar a Confederação de Futebol da América. Além de ser o ano do primeiro Fla-flu no
futebol, o ano teve ainda como destaque a entrada de sócio para o Fluminense do
escritor Coelho Neto, empolgado com o clube das Laranjeiras e a paixão pelo
futebol de seus filhos. O literato será um dos maiores símbolos da história do
tricolor, além de ter criado o hino do clube em 1915.
O Botafogo disputou um campeonato
paralelo em 1912, ao criar Associação
de Football do Rio de Janeiro (AFRJ), em virtude de um protesto pela suspensão de um atleta seu
no ano anterior. Além do Botafogo, campeão da competição, disputaram os
seguintes clubes: o Cattete, o Internacional. O Germânia, o Paulistano e o
Petropolitano.
O
ano termina em festa para os torcedores vascaínos. O tradicional passeio para o
pic nic na Ilha do Engelho é realizado contando com a presença de mais de 500
pessoas que lotam uma barca. Todas as principais revistas da época (Fon-fon, O Malho e Careta) registram em
fotos os momentos de descontração, animação e festividade. Era a arrancada para
o inédito tricampeonato no Remo.
A
grande estrela da festa do primeiro campeonato era uma embarcação chamada Íbis.
Ela “tornou-se uma lenda no remo do Rio de Janeiro do início do século XX. O
barco de fina fabricação italiana, construído nos estaleiros da Galinari &
Co, de Livorno/ITA, ganhou a alcunha de "O Barco Invencível". Sua
estréia ocorreu em julho de 1912 e reinou absoluta com dezenove vitórias
consecutivas, um grande feito para época “[2].
Fonte: Livro “100 anos da
Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário