domingo, 22 de janeiro de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1966 CAMPANHA CONTRA OS CARONAS


                                                        “Bicha, Bicha, Bicha!!!”
                                          Protesto contra o juiz Armando Marques


1966              Campanha Contra os Caronas (CCC)

O ano começa com a expectativa do Brasil conquistar o tricampeonato mundial na Inglaterra. Para o Vasco o começo de ano não foi positivo. Além da preocupação com a contratação de reforços para o time voltar a ser competitivo, os torcedores pediam para o presidente do clube Manoel Lopes não sair. Mas este estava irredutível. A crise vascaína nos anos 1960 parecia não ter fim.
No torneio Rio-São Paulo, o entusiasmo de 1965 deu lugar ao temor diante dos episódios de violência dos paulistas: “o medo de novas baixas como na última refrega, quando alguns companheiros voltaram com pernas e cabeças quebradas a pedradas, impediu a Senhora Dulce Rosalina, chefe da Torcida Organizada do Vasco, de reunir mais de 20 pessoas para ir hoje, a São Paulo, animar a equipe do Vasco contra o Corinthians”[1].
Aquela não seria uma partida qualquer. Era a primeira partida de Garrincha pelo Corinthians, contratado junto ao Botafogo e maior esperança dos paulistas do fim de jejum de 11 anos sem o campeonato paulista. E o receio dos cariocas realmente fazia sentido pois o Pacaembu ficou lotado para a estreia de seu novo ídolo. Em campo, quem brilhou foi o Vasco, que vence por 3 a 0.
            No aniversário de Dulce, em março, comparecem lideres de várias torcidas. Entre eles: Paulista do Fluminense, Trazan do Botafogo e Jaime de Almeida do Flamengo, além de dirigentes do Vasco que cedem a sede no centro como o local da festa.
            Mal comemorava o aniversário, Dulce investia suas garras contra os dirigentes do Santos dispostos a levar o zagueiro Brito para a equipe paulista: “Os Chefes da Torcida Vascaína, Dulce Rosalina e Ramalho, prometeram comparecer hoje ao Aeroporto Santos Dumont, para hostilizar o Presidente do Santos, que segundo se anuncia, vêm fazer nova tentativa para contratar o zagueiro central Brito para o Santos. A torcida vascaína promete fazer tudo que estiver a seu alcance para dissuadir os dirigentes do Santos do seu intento”[2].
            Pela primeira vez o torneio Rio-São Paulo termina com o título dividido por quatro clubes (Vasco, Botafogo, Santos e Corinthians) em função da falta de datas para uma disputa entre os finalistas. A maior preocupação para os dirigentes era a seleção brasileira e até aquele momento ninguém sabia quem seria escolhido.
A preparação da seleção para a Copa do Mundo na Inglaterra foi a pior possível e a convocação de 44 jogadores, formando 4 times que disputavam entre si qual seria o grupo final, provocou indisciplina, disputas e intrigas entre jogadores e dirigentes, com acusações contra tudo e todos. O resultado foi previsível para muitas pessoas com a eliminação do Brasil ainda na primeira fase. O vascaíno e poeta Carlos Drummond resumia a tristeza generalizada no país com a derrota:  “não há nada mais triste do que o papel picado, no asfalto, depois de um jogo perdido. São esperanças picadas”[3] .
De volta ao Brasil, os dirigentes fazem de tudo para impedir a fúria dos torcedores no aeroporto. Com chegada prevista para as 9 horas da manhã de domingo, o vôo é transferido para chegar às 11 da noite. Novos atrasos e finalmente o desembarque é feito na madrugada de segunda-feira.
            O resultado pífio na Inglaterra mostrava que medidas urgentes deveriam ser tomadas para melhorar a administração do futebol. Neste intuito, dirigentes da Federação carioca de Futebol reuniram as principais lideranças dos torcedores: “sugeriram que os sócios dos Clubes paguem uma arquibancada em jogos no Maracanã em local reservado, a extinção da FUGAP e a revogação da lei que da 15% aos jogadores quando a venda de seus passes. Os Chefes das Torcidas foram a FCP a fim de tratar com o Sr Ícaro França do concurso para eleger a melhor Torcida, mas como o dirigente pediu que dessem sugestões, ao mesmo tempo em que sugeria que os torcedores formassem uma Associação”[4]. Além disso os líderes pediram para acabar com as gratuidades que os dirigentes tem direitos, chegando a mais de 1.000 por partida, segundo denúnica dos torcedores.
 Com a fraca campanha no campeonato carioca o alvo principal de parte da torcida recaiu sobre os ombros de Zéze Moreira, técnico do clube desde 1965, que tem seu nome numa faixa pedindo a sua saída. No entanto, os protestos partem de outro setor diferente da TOV: “Dona Dulce Rosalina contou que a Torcida Organizada nada tem a ver com relação a esta faixa. Esclareceu, inclusive, que as pessoas que fizeram a faixa tentaram colocá-la no lugar onde fica a Torcida Organizada e ela não consentiu”[5].
            No dia primeiro de novembro os jornais anunciam que o presidente do Vasco, João Silva, proíbe Dulce Roslaina de frequentar as dependencias do clube, acusando-a de atrapalhar o trabalho do técnico. No dia seguinte vem a resposta de Dulce que “decidiu recolher as bandeiras em sinal de protesto, ou o clube despede Zezé Moreira, o técnico, ou ela, Dona Dulce, leva a torcida a greve, esvaziando as arquibancadas do Maracanã, lado direito da Tribuna de Honra. É um direito que tem a moça atribuir ao treinador a culpa de tanta derrota, mas gostaria de pedir a dona Dulce que, na medida do possível, procure maneirar a torcida do Vasco que anda muito desbocada. No mais, Dona Dulce, dou razão a senhora: O Time do Vasco da Gama está justificando uma greve unânime da classe Vascaína[6]. A promessa de uma greve em plena ditadura militar era um sinal que os torcedores não queriam mais ser tratados de forma passiva e passavam a incorporar discursos e praticas de resistencias ao regime excludente.
            Mesmo o Jornal do Brasil sendo apontado como um período liberal e simpático aos movimentos populares da época, o tratamento que uma notícia dá para Dulce Rosalina é o pior possível, acusando-a de não saber se portar como torcedor, comparando com as atitudes de Jaime, em que este dá total apoio ao clube: “D. Dulce Rosalina deu com os burros nágua em sua Campanha contra o Time do Vasco. Nessa jogada, D. Dulce perdeu todo o prestigio, porque se portou como péssima torcedora. Torcedor, D. Dulce é o Jaime de Carvalho, que leva sua Charanga para apoiar o Flamengo, seja quem for o Técnico, esteja o Time como estiver, é o Juarez, do Bangu, que bota a camisa do Clube no corpo, pinta sua casa de vermelho e branco e já perdeu a conta das vezes que chorou nas decisões perdida”[7].
Satisfação em 1966 ocorreu somente com a vitória do Bangu sobre o Flamengo na final do campeonato carioca. O Maracanã viu juntar as torcidas de Vasco, América, Fluminense e Botafogo, que comemoraram um dos maiores bailes numa final, além de uma incrível pancadaria em campo, protagonizada pelo nosso ex-ídolo Almir, inconformado com o “olé” dos jogadores banguenses e prometendo aos dirigentes rubro-negros que o Bangu não daria a volta olímpica.
Quando Almir iniciou a briga, a torcida do Flamengo estava revoltada. Ele relembra: “Assim que voltei, a torcida do Flamengo, mais de 100 mil presentes, começou a gritar”:
- Por-ra-da ! Por-ra-da ! Por-ra-da !
            Depois do jogo a briga se estendeu para as arquibancadas, com confrontos generalizadas entre os torcedores. Numa das maiores brigas no Maracanã até então. O jogo terminou com o resultado de Bangu 3 a 0 no Flamengo, levando um público de 143.978 no dia 18 de Dezembro.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Jornal Diário de Notícias 02 de Março de 1966.
[2] Fonte: Jornal Correio da Manhã 11 de Março de 1966.
[3] Drummond, Carlos. Quando é dia de futebol. Rio de Janeiro; Record, 2002. p.82. Crônica publicada no jornal Correio da Manhã  em 17 de julho de 1966.
[4] Fonte: Jornal do Brasil 23 de Agosto de 1966.
[5] Fonte: Jornal do Brasil 18 de Outubro de 1966.
[6] Fonte: Jornal do Brasil Coluna “Na grande área” de Armando Nogueira 02 de Novembro de 1966
[7] Fonte: Jornal do Brasil 05 de Novembro de 1966.

Vasco 1966

 
Vasco Jornal O Globo 1966

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