“Sem Roberto a Seleção vai Perder”
faixa no aeroporto
1986 Telê-Didi-Pelé
Quem
era torcedor vascaíno e chegava mais cedo para ver a preliminar entre os
juvenis já conhecia o talento de Romário desde 1983[1].
Sua velocidade, suas arrancadas, dribles e gols já eram comemorados pelos
torcedores que vislumbravam um futuro artilheiro para o clube de São Januário.
Em
1986 Romário assegurou definitivamente o lugar de titular e, junto de Roberto,
compôs uma dupla infernal. O melhor exemplo foi o que aconteceu na decisão da
Taça Guanabara no dia 21 de abril quando Vasco e Flamengo lotaram o Maracanã
(mais de 120 mil) e Romário fez os dois gols da vitória. Foi uma festa nas
arquibancadas que se prolongou por toda a cidade: “eram cânticos
de guerra, batalha de bandeiras e muito carnaval, tudo misturado. Na
arquibancada, parte da bateria da Escola de Samba Império Serrano empurrava o
Vasco em campo. O tradicional “Casaca, casaca, zaca, zaca, zaca.../A turma é
boa, é mesmo da fuzarca...” se misturava com o refrão do samba-enredo mais
popular do Carnaval: “Me, dá, me dá, me dá o que é meu/ Foram oito anos (adaptação para o
tempo em que o Vasco ficou sem o título da Taça Guanabara) que alguém comeu...”[2].
Antes
da decisão, Renato Aragão e Pelé, dois históricos torcedores do Vasco, tinham
calado a torcida do Flamengo, ao entrarem juntos para gravarem cenas do filme
“O Rei e os Trapalhões”. Na ocasião todas as imagens foram do lado direito,
junto da torcida vascaína. A torcida do Flamengo morta de inveja só assistia de
longe e via os protagonistas ensaiarem jogadas e correrem para comemorar junto
a torcida da Cruz de Malta.
Enquanto
o filme de Didi (Renato Aragão) fazia enorme sucesso com uma bilheteria de mais
de 3,5 milhões de espectadores, o cinema nacional ficava mais pobre com o fim
do Canal 100[3] em 1986. Em função da
extinção da lei que permitia a propaganda nos cinejornais, os produtores
daquela equipe encerraram as suas atividades. A própria decisão de 1986 foi
filmada pelo pessoal do canal 100. Uma perda irreparável para o futebol e para
os torcedores que a cada sessão se encantava com a magia das imagens que só o
canal 100 conseguia nos proporcionar.
Como
era ano de Copa do Mundo no México todas as atenções estavam voltadas para ver
o Brasil repetir o que fez naquele país em 1970. Desde o carnaval com o desfile
da Beija-Flor com o enredo “O mundo é uma bola”, que as torcidas se preparavam
para fazer um novo carnaval em junho. Neste desfile da escola de Nilópolis
várias torcidas organizadas foram chamadas para participar e formaram uma ala
específica.
Sem
nenhum jogador convocado, ao contrario dos adversários cariocas, parte da
torcida do Vasco foi em maio no aeroporto para o embarque protestar levando
faixas e cartazes pela ausência de Roberto na seleção. A derrota para a França
nos pênaltis serviu de consolo para a torcida vascaína e a certeza de que com o
artilheiro de São Januário as chances do Brasil seriam melhores. De quebra,
poderia gozar de Zico e Sócrates, jogadores do Flamengo, que perderam pênaltis
neste jogo decisivo.
Com
a transmissão dos jogos tela TV, o melhor veio de um comportamento dos
torcedores mexicanos que foi exportado para todo o Brasil: a ola.
Virou
uma verdadeira febre entre as torcidas brasileiras fazer a “ola” quando os estádios
ficavam cheios, repetindo a coreografia inventada pelos mexicanos. Milhares de
pessoas em filas verticais iam levantando os braços em sintonia perfeita por
toda a extensão da arquibancada.
O
jornalista Nelson Mota, cobrindo para o jornal O Globo, relata a impressão do
fenômeno: “o papo é sobre a ‘ola’ nos estádios, uma das grandes sensações desta
Copa, uma criação espontânea da torcida mexicana que está deslumbrando o mundo
com sua espetacular plasticidade e dinâmica, como se fosse uma obra de arte de
massa”[4].
Se
no primeiro semestre tudo perecia a nosso favor, no segundo, a sorte virou de
lado, dentro e fora dos gramados. Perdíamos o campeonato carioca com um time
superior ao rival e no começo do campeonato brasileiro, vários torcedores
ficaram feridos em um confronto de torcidas em Vitória (ES). Na ocasião o
jornalista Sergio Cabral dedicou toda a sua coluna[5]
para condenar o fato: “a torcida carioca foi apedrejada, recebeu paulada,
etc. E nenhuma autoridade local tomou qualquer providência para protegê-la. Foi
sem dúvida, um domingo amargo para aqueles torcedores que viajaram em cinco
ônibus (...)É um sacrifício que só a paixão do futebol pode explicar. São
portanto, pessoas que merecem todo o carinho de quem deseja que o Brasil tenha
um futebol sadio e vibrante”, conclui.
Ainda
no final do ano, um jogo entre Vasco e Corinthians em São Januário, terminou em
confusão dentro e fora do estádio. Com a infiltração de torcedores do Flamengo
junto aos paulistas, acirrou ainda mais o animo dos torcedores. Na véspera,
numa reunião dos torcedores vascaínos com o comandante do 4° Batalhão sobre os
problemas que poderiam ocorrer. No entanto, com policiais despreparados para os
conflitos nos grandes eventos esportivos, não conseguiram deter uma briga que a
imprensa deu grande repercussão nos dias seguintes.
Foram
vários jogos neste fim de ano que terminaram em confusão envolvendo várias
torcidas[6] de
diferentes estados. Para a imprensa esportiva carioca, começava a mudar a forma
de ver as torcidas organizadas. Nos próximos anos o tom depreciativo começa a
ganhar cada vez mais espaço.
Fonte: Livro “100 anos da
Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
[1] Na
categoria juvenil e juniores do Vasco, consegue por três anos seguidos ser
artilheiro e campeão carioca nos anos de 1982,1983 e 1984. No profissional começou nos anos seguinte e já no Campeonato
Carioca de 1985 foi vice-artilheiro. Terminou artilheiro do campeonato carioca
de 1986 (20 gols) e 87 (16 gols).
[2] Fonte Revista Placar 28 de Abril de 1986.
[3]
Sobre o assunto, Carlinhos Português lembra a paródia da música: “Garota eu sou da Força Jovem, vou ver meu time no
cinema, freqüento a Praia de Ipanema, eu vou curtir uma legal, Eu
dou a volta, eu picho muro, eu fumo um bagulho,
assalto banco, na minha vida ninguém manda não, eu vou onde vai o Vascão, eu
dou porrada pra valer, eu boto a Jovem pra correr, antes do jogo eu vou beber,
durante o jogo eu vou torcer” (versão de De repente Califórnia de Lulu Santos).
[4] Nelson Motta, Confissões
de um Torcedor. Objetiva. Rio de Janeiro. 1998, p. 64.
[5] Fonte: Jornal O Globo Coluna Papo de Esquina de
Sérgio Cabral 25 de Setembro de 1986.
[6] UM GRITO DE PAZ NA TORCIDA, VIOLÊNCIA ESTÁ
ACABANDO COM FESTA DO FUTEBOL: Briga no
Fla-Flu e no Vasco X Corinthians.. Fonte: Jornal do Brasil 18 de Dezembro de
1986
Vasco Maracanã 1986 |
Vasco São Januário 1986 |
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