“Um hurrah! Ao Club
de Regatas Vasco da Gama”
Grito de guerra da época
Grito de guerra da época
1921 A Torcedora do Vasco
As
emocionantes partidas nas finais dos campeonatos carioca e paulista de 1920
motivaram reações e comentários que extrapolaram o domínio esportivo. No
primeiro dia de 1921, o cronista Lima Barreto escreve um artigo para a Revista
Careta (“Uma Conferência Sportiva”) criticando o comportamento agressivo nos
campos de futebol. Ainda no final do ano anterior um decreto presidencial
aplicava novas medidas disciplinares para o público nos cinemas, teatros e
praças esportivas, no entanto, permitia cânticos, gritos e rumores nos últimos
espaços. O que denota a participação ativa da platéia esportiva e o
reconhecimento do papel dos torcedores de forma diferenciada do público nos
recintos fechados.
Em
São Paulo a novidade no campeonato da primeira divisão era a presença de mais
três clubes formados pelas comunidades de imigrantes: a Portuguesa, o Sírio e o
Germânia. A Portuguesa fazia sua estréia através de uma fusão com o tradicional
Mackenzie. Ao todo 12 equipes disputariam o campeonato.
No Rio
acontecia o movimento inverso com a diminuição do número de clubes na primeira
divisão. Enquanto no ano de 1920 o campeonato foi disputado por 10 clubes, para
1921 ficariam apenas 7 clubes. Contudo, a partir deste ano, cada vez mais os
torcedores do Vasco conviveriam com o ambiente dos clubes da primeira divisão e
suas respectivas torcidas. No Torneio Início de 1921 a novidade foi a inclusão
dos clubes da série B (onde o Vasco estava) para disputar com os clubes da
série A. Milhares de torcedores compareceram ao estádio das Laranjeiras em
abril para acompanhar seus times e a surpresa ficou com a final da competição
entre dois clubes da série B: Vasco e Palmeiras.
Apesar
da derrota na final, o futebol do Vasco passa a ser destaque na imprensa que
começa a dar mais ênfase aos clubes da série B e suas respectivas torcidas.
Antes desta competição que marcou o início oficial do futebol carioca de 1921,
Vasco e Helênico pelos segundo times disputaram a final dos segundos times
referente aos ano de 1920. Com a vitória, os vascaínos finalmente conquistaram
seu primeiro título no futebol. Para comemorar com os jogadores, centenas de
sócios se reuniram em um jantar em que “oradores exaltaram o êxito alcançado e
os vascaínos empolgados saíram em passeata pela cidade” (Rocha, 1975, p.294).
O principal veículo de imprensa esportiva da
época o Jornal Sport Ilustrado, por inúmeras vezes acompanha o
desempenho do time. O melhor exemplo foi a reportagem da partida entre Vasco e
Vila Isabel, os clubes de maiores torcidas e com rivalidade de uma certa
tradição: “esta partida considerada como uma das mais importantes da série B do
campeonato do Rio de Janeiro, levou ao campo do América numerosa concorrência.
O jogo foi bem disputado e trouxe a assistência
em constante emoção pelos belos lances que proporcionou. O encontro
ocorreu normalmente e não houve protestos nem distúrbios de espécie alguma”.
Era
a primeira vez que um jogo do Vasco reunia no campo do América mais de 1.000
pagantes (sócios não pagavam) com uma renda recorde na série B de 1 conto e 500
mil réis, causando grande repercussão na imprensa e no mundo esportivo carioca.
Embora o Vasco tenha vencido o Vila
Isabel nesta partida, o título ficou com o adversário e a torcida teria que se
contentar em aguardar mais um ano. Mas a boa notícia viria com a conquista da
7° título carioca de remo e com a aquisição em dezembro (por empréstimo) do
campo do Rio de Janeiro na rua Moraes e Silva. O clube pagaria 650 mil réis por
mês e deixaria de treinar no campo da rua Barão de Itapagipe.
Até conseguir seu próprio estádio, o
clube tinha que alugar para as partidas oficiais as praças esportivas de outros
clubes com o pagamento de 10% da renda. Seria uma grande economia pois o clube
já conseguia renda de 1 conto por partida, o que era uma soma apreciável para
um clube da série B.
Embora fosse campeão no Remo neste
ano e permanecesse na série B no futebol para o ano seguinte, as expectativas
para os remadores não eram boas em função das obras promovidas pelo prefeito do
Distrito Federal, Carlos Sampaio, que realizavam o desmonte do morro do Castelo
e o aterramento de uma imensa região afetando a área de treinamento de vários
clubes náuticos da região, inclusive o Vasco da Gama.
No futebol, para encerrar a
temporada foi marcado um amistoso contra o campeão da cidade de Petrópolis, o
Serrano F.C.. Dezenas de adeptos se organizaram para acompanhar o time
provocando um verdadeiro alvoroço na região reunindo uma platéia para o jogo
nunca antes registrada na cidade serrana. Foi uma verdadeira invasão vascaína:
“os trens da linha regular e os extraordinários organizados especialmente foram
insuficientes para conter a avalanche de
associados em excursão alegre e festiva” (Rocha. 1975, p.308).
Neste mesmo período era disputado o Campeonato
Sul-Americano de Seleções com a presença de praticamente todos os jogadores do
Rio de Janeiro com a recusa dos paulistas. Entre os selecionados nenhum negro
seguindo recomendações para evitar que a torcida Argentina chamasse os
jogadores brasileiros de “macaquitos”.
O
racismo expresso nos campos esportivos era um dos motivos que levaria o
escritor Lima Barreto a
combater o futebol como um torcedor, ou melhor, como um anti-torcedor. Para ele
o esporte apresenta exatamente o contrário daquilo que seus divulgadores e
propagandistas exaltavam: o ideal civilizatório. O futebol, para Barreto, além
do racismo, estimularia os conflitos generalizados, independentes de classe
social, origem, nacionalidade. Para ele, o futebol provocava o acirramento de
rivalidades entre diferentes bairros, cidades e países, levando a sentimentos
menores, incentivando a população se manifestar de forma grosseira e
animalesca.
Infelizmente o escritor morreria em
1922 e não teria tempo para ver a Revolução que a equipe de futebol do Vasco
promoveria em campo no ano seguinte. Provavelmente ele teria que reformular sua
visão sobre o esporte que tomava outros rumos a partir daquela conquista tão
marcante.
Os
anos 1920 seriam marcados no século XX por criarem muitas mudanças na vida
política, econômica e social no Brasil. Os traços de uma sociedade marcada pelo
machismo, pela segregação social, pelo autoritarismo das elites e pela ausência
de participação da sociedade na vida política do país entravam em um processo
de forte contestação.
No
teatro, por exemplo, uma peça sobre o comportamento de uma mulher nos estádios, chama atenção para o que estava
mudando, ainda que estas mudanças fossem muito tímidas. Na peça “ A Torcedora
do Vasco”, de Antonio Quintiliano, encenada no Teatro Recreio num
festival em homenagem ao clube,
“apesar de ser uma obra com forte tom caricatural, é possível perceber um novo
perfil feminino traçado por intermédio do esporte que no caso não é o futebol,
mas o remo. No lugar das mocinhas desprotegidas, à espera de um casamento ou
subordinadas aos seus maridos, vemos uma mulher que autoritariamente inverte os
papéis e que ao longo da peça não cansa de repetir “Que marido maricas!” (...)
Sofia não é aquele tipo de esposa prendada e sempre preocupada em cuidar do
marido, ao contrário, Sofia “só cuida de regatas!” Nada de cozinhar, lavar
roupas ou limpar a casa, pegar o carro e ir à praia torcer pela equipe de remo
do Vasco da Gama é a principal atividade de Sofia”[1].
____________________
[1] COSTA,
Leda Maria da . O
que é uma torcedora? Notas sobre a representação e auto-representação do
público feminino de futebol.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge
Medeiros.
Vasco Jornal Sport Ilustrado 1921 |
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