domingo, 9 de outubro de 2016

VASCO 2016: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1938 EMBAIXATRIZ VASCAÍNA NA FRANÇA

“eu considero cada sócio do meu Clube como um cabo e assim terei muitos votos”
         Leonor, eleita para representar a torcida brasileira na Copa de 1938

1938             Embaixatriz Vascaína Na França

            A preparação da seleção brasileira para a Copa do Mundo na França contou com todo o apoio do governo Vargas interessado em utilizar o futebol para propagar as idéia do nacionalismo e da necessidade de unidade da nação. Era a primeira vez que o Brasil mandaria sua força máxima para o exterior, sem a divisão entre paulistas e cariocas ou amadores e profissionais. O incentivo aos jogadores unia a imprensa escrita e o rádio mandaria suas primeiras equipes para transmitir os jogos diretos das cidades francesas.
            Para incentivar ainda mais o interesse da população dois jornais cariocas lançaram a campanha para a eleição do embaixador e da embaixatriz da torcida brasileira. Os vencedores representariam o país nas arquibancadas francesas representando o espírito de união do time e a nação. Cada clube teria direito a lançar um candidato de cada sexo. Para o Vasco concorreriam o tradicional líder da torcida vascaína, Polar e sua filha Leonor Silva: “a graciosa Rainha do Vasco da Gama, já esta com sua candidatura lançada no Grande Concurso que O Globo e o Jornal dos Spors estão realizando (...) Ninguém pode negar os predicados da jovem e linda sportwoman e daí a boa escolha que teve o seu nome para representar o grêmio Vascaíno no certame. Leonor Silva será uma das mais sérias candidatas ao título de Embaixatriz, porque conta com o apoio da grande Torcida Vascaína (...) Leonor recebeu o repórter com a gentileza habitual e falou.“Foi uma surpresa agradável lançarem o meu nome como candidata do Vasco. O concurso será renhido, mas conto com a vitória, porque o Vasco nunca perde nos concursos. Basta que cada Vascaíno apresente um voto por dia para a sua Rainha, e estarei bem colocada no Concurso. No caso de vencer o certame, serei uma torcedora entusiasta das cores brasileiras nos campos de Paris. E quem será o seu cabo eleitoral? O Chefe é meu pai. Mas eu considero cada sócio do meu Club, como um cabo e assim terei muitos votos. A Rainha precisa dos seus súditos. ”POLAR CANDIDATO DO POVO. Affonso Silva, o Polar, também é candidato ao título de Embaixador.“Eu também serei candidato ao título de Embaixador diz ele inicialmente. Tenho prestado serviços ao meu Club e aos jogadores, quando se realiza qualquer Concurso e agora chegou a minha vez de pedir votos. O Concurso exige um torcedor renitente, e que faça vibrar as multidões. Eu considero-me dentro das exigências pedidas pelo regulamento. Procurarei elevar bem alto o nome de meu paíz nos gramados da França, e caso derrote os meus adversários, procurarei o senhor Prefeito da Cidade, para que faça-me oferta de uma bandeira brasileira, afim de que eu possa desdobra-la nas arquibancadas parasienses. Eu confio na vitória da minha candidatura, porque serei o candidato do povo. Faço por intermédio do Globo, um apelo aos torcedores e associados do Vasco, para que levem votos ao Estádio na noite de sábado, quando será realizado o jogo Flamengo e Vasco”[1].
            O resultado final acabou premiando as duas maiores torcidas do Rio com a eleição de Oswaldo Meneses, do Flamengo, como o ganhador aa categoria Embaixador, levondo o seu irmão como acompanhante, e a Embaixatriz escolhida foi a vascaína Leonor Silva, que levou como acompanhante o seu pai, Affonso da Silva, o Polar.
            Um outro jornal carioca faz a divulgação da campanha do “Selo pró-Seleção”. Tratava-se da campanha promovida pela Confederação Brasileira de Desportos (CBD) na emissão de 100.000 selos para custear a viagem e hospedagem dos atletas na França. Além disso, cada selo tinha um número para ser sorteado e o ganhador embarcaria junto com a seleção. Numa ação combinada de patriotismo e sistema de apostas, milhares de pessoas se mobilizaram para comprar os seus bilhetes. Em tom patriótico e otimista, João de Luca, atuando como representante dos adeptos vascaínos, é quem responde em nome de sua torcida, estimulando a compra dos selos, apesar da campanha inicial do time do  Vasco (perdeu vários amistosos), deixar dúvidas para a sua torcida de como seria o desempenho do time depois da Copa do Mundo, quando seria iniciado o campeonato carioca: “os Brasileiros e o Vasco abafarão em 1938. Brilharemos na Europa. O Imparcial pode preparar-se para a recepção dos “Campeões do Mundo”. Como sempre acontece, João de Lucca é um dos mais ativos animadores das grandes manifestações da torcida carioca. Ninguém mais do que ele, por ocasião do regresso dos jogadores Brasileiros, vice Campeões sul americano, pugnou para o brilhantismo da recepção. Lucca é um ardoroso torcedor do Vasco da Gama, é o chefe da torcida Vascaína e a sua atividade neste setor é sempre notável. Como brasileiro, ele está olhando as possibilidades da nossa turma em Paris, tanto assim, que veio trazer a sua adesão a campanha do nosso pebliscito (...) devo acentuar que o Vasco, com os novos cracks vão assombrar no Campeonato de 1938. Estes fracassos de agora são porque estamos sem conjunto. Temos um agrupamento de cracks sem entendimento entre si, mas assim que eles se entenderem, vamos abafar. Isso não tenho a menor dúvida, falou o grande torcedor dos brasileiros e do Vasco da Gama” [2].
                        Ainda antes da Copa na França, as equipes de Vasco e Flamengo disputam uma acirrada partida nas Laranjjeiras com a presença das duas torcidas separadas em local próprio. Os vascaínos eram chamados para ficar em um local bem distante dos rubro-negros: “CONCENTRAÇÃO DA TORCIDA VASCAÍNA NA ARQUIBANCADA DO LADO DO RELÓGIO, O LOCAL ONDE ESTARÃO TODOS OS VASCAÍNOS. Como sempre acontece por ocasião de jogos entre as equipes do Vasco e do Flamengo, Olympio Pio e João de Lucca, dois valorosos generais Cruzmaltinos, estarão hoje, na arquibancada do Estádio do Fluminense, que fica sob o relógio, com o pavilhão do grande e tradicional grêmio da colina de São Januário, desfraldado, em torno do qual se deverão concentrar todos os torcedores do Vasco, para a uma voz, concitar os jogadores da camisa preta, a vitória. Olympio Pio e João de Lucca, em palestra com o nosso redator, disseram que contam com o apoio integral da família Vascaína, pois na arquibancada fronteira estarão os Flamengos torcendo ardorosamente, pela vitória das suas cores. De sorte que, veremos logo mais no Field nas Laranjeiras, uma reedição da famosa competição dos torcidas, realizada sempre nos famosos Fla-Flu” [3].
            No embarque da seleção brasileira para a França, milhares de pessoas se deslocam até o cais do porto para desejarem boa sorte aos atletas. O hostoriador Fábio Franzini (2003, p.72) destaca a reportagem do dia seguinte feita pelo jornal paulista Gazeta Esportiva: “Desde meio-dia, portanto duas horas antes de largar o “Arlanza”, o povo começou a afluir ao cais (...) em ambiente de intensa vibração. A multidão se cumprimia na Praça Mauá (...) foi a maior demonstração de simpatia a uma embaixada esportiva patrícia na sua partida para o estrangeiro”.
            A medida que a seleção brilhava nos campos franceses aumentava o entusiasmo dos brasileiros que ouviam pela primeira vez uma Copa do Mundo com a transmissão das partidas pelo rádio. Até a derrota para a Itália a euforia tomava conta das casas e ruas de todo o país. Em seu diário, o presidente Getúlio Vargas, se impressiona pela reação dos brasileiros após o resultado adverso: “A perda do team brasileiro para o italiano causou uma grande decepção e tristeza no espírito público, como se se tratasse de uma desgraça nacional” (Franzini, 2003, p.82)
            Depois da Copa do Mundo, o humilde estádio da Gávea é inaugurado em 4 de setembro de 1938, com uma partida disputada entre Vasco e Flamengo, pela primeira rodada do campeonato carioca daquele ano. Segundo o jornal A Noite, "as solenidades que precederam o encontro Vasco x Flamengo assumiram aspectos de grande expressão cívico-esportiva. Porém, quando a bola rolou, o Vasco encarregou-se de estragar a festa, vencendo por 2x0. Ambos os gols foram marcados por Niginho, um em cada tempo. O resultado, inclusive, desencadeou uma crise no clube da Gávea, culminando com a rescisão do contrato do técnico Dori Krüschner.
Niginho, que foi o artilheiro do campeonato em 1937, era reserva da seleção brasileira que conquistou o terceiro lugar na Copa de 1938. Na volta ao Brasil, ele e o outro jogador vascaíno Jaú (zagueiro), foram festejados pela torcida cruzmaltina. No entanto, o grande destaque daquela competição era Leônidas da Silva. Apesar de tudo, no futebol carioca quem mandava era o Fluminense que vence mais um campeonato conquistando o tricampeonato.
            Até o fim do ano a revista semanal O Globo Sportivo escreveria uma matéria especial com um torcedor e como era o seu jeito de torcedor. Do Vasco foram tres matérias. Uma sobre uma criança de 10 anos, outra sobre o garçom do bar de Sao Januário e a terceira sobre uma jovem. Em cada matéria vinham as fotos dos personagens e uma entrevista. A torcedora sugere algo que se tornaria comum nas torcida paulistas nos anos 1940: copiar o estilo de torcida dos norte-americanos. O que denota a forte influencia do cinema americano no Brasil naqueles tempos. Se levarmos em conta que os cinejornais americanos chegavam com facilidade aqui e o cinema era a maior diversão popular vemos que as imagens começavam a fazer parte significativa do imaginário cotidiano dos torcedores, revolucionando a forma de torcer, com a influencia de outras regiões sobre cada lugar onde ele fosse praticado. Diz a torcedora: “já assistiram os filmes esportivos americanos, quando a assistência aparece toda padronizada, em preto e branco e tem seus cantos que incentivam, cem por cento os jogadores em campo? Pois bem poderíamos fazer isso no Rio. E então, veriam, não como eu torço, mas como nós torcemos. Como o Vasco torce” [4].
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Jornal O Globo 11 de Fevereiro de 1938.
[2] Fonte: O Jornal O Imparcial 20 de Fevereiro de 1938.
[3] Fonte: Jornal dos Sports 22 de Maio de 1938
[4] Fonte: Jornal O Globo Esportivo 21 de Outubro de 1938.

Vasco Jornal O Globo 1938

Vasco Jornal O Globo 1938


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