“Tua imensa torcida é bem feliz
Norte-Sul, Norte-Sul deste país”
Hino criado Lamartine Babo
Norte-Sul, Norte-Sul deste país”
Hino criado Lamartine Babo
1948 O Expresso conquista a América
Na década de 1940, durante
o domínio do Expresso da Vitória, o carnaval dos vascaínos durava mais que 4
dias, se prolongando por semanas e até meses, como no ano de 1948. Entre o
final de 1947 (conquista do campeonato carioca) e o título sul-americano em
março de 1948, a torcida vascaína não teve tempo de descanso. Em janeiro os
jornais noticiavam: “Promovida pela Legião da Vitória do Vasco da Gama,
realiza-se hoje no trecho da Rua General Caldwell, entre a Avenida Presidente
Vargas e Rua Frei Caneca, a maior Batalha de confete do ano, Milhares de
lâmpadas, ornamentação soberba e três bandas de música, a saber: Banda
Portugal, Banda da Polícia Militar e Banda Municipal (...) Um grande cortejo
será formado na Praça da Bandeira, ás 22 horas, a fim de conduzir a Diretoria
do Vasco ao local dos festejos. Os associados que desejarem incorporar-se ao
mesmo, deverão comparecer as 21.30 horas, a Praça da Bandeira junto ao Cinema”[1].
Na
volta da delegação para o Rio de Janeiro, em março, depois do inédito campeonato
no Chile, a torcida vascaína preparou uma grande festa. Os pesquisadores Alexandre Mesquita e
Jefferson Almeida, autores do livro "Um Expresso chamado Vitória” (2008),
descrevem o cenário apoteótico na cidade em que “as ruas estavam repletas de
torcedores de todos os clubes que levaram faixas e cartazes para saudar seus
heróis. A chegada ao Santos Dumont aconteceu somente duas horas mais tarde. A
multidão se apertava para recepcionar os campeões do continente (...) No
trajeto até São Januário, mais folia: as avenidas Rio Branco e Presidente
Vargas pareciam estar em plena época de Carnaval. Estampava-se no semblante de
toda aquela gente um orgulho diferente de ser brasileiro. E tudo isso graças ao
Expresso da Vitória”.
As
conquistas internacionais do Vasco não se encerraram no Chile em 1948. Em
junho, um atleta vascaíno do basquete (Alfredo da Motta) ganhava uma medalha de
bronze, pela seleção brasileira nos Jogos Olímpicos em Londres. Era a pela
primeira vez que o clube tinha um medalhista olímpico. Ainda neste mês o
futebol inglês, representado pelo Southampton, fazia uma excursão pelo Rio de
Janeiro, enfrentando os clubes cariocas. Depois de derrotar o Flamengo em São
Januário, os ingleses seriam derrotados pelo Vasco. Fora de campo as duas
torcidas travaram um duelo à parte. Antes da partida com o Vasco, o escritor
José Lins do Rego escrevia em sua coluna no Jornal dos Sports no dia 10 de
junho com a seguinte manchete: “Vamos torcer pelo Vasco” e faz um apelo
nacionalista para que todos se unissem contra o rival estrangeiro: “a torcida
vascaína que vaiou o Flamengo de modo tão fora de ética cometeu um erro tremendo
(...) nós do Flamengo deveremos aplaudir os brasileiros do Vasco da Gama. Como
se fossem os brasileiros do Flamengo”.
O sucesso do clube em campo era transferido também
para os seus torcedores. Em julho, o jornalista Mario Filho escreve três crônicas no Revista O Globo Sportivo, narrando o drama familiar
de João de Luca, líder da torcida vascaína (TOV), casado com uma torcedora do
Flamengo. Do início do namoro quando um não sabia o time do outro até a
descoberta da divisão das paixões futebolísticas, cada um tentando respeitar o
direito do outro de torcer pelo seu time. Em casa, no meio da poltrona, um
objeto para lá de suspeito na residência de um vascaíno: uma almofada bordada
pela noiva como enxoval do casamento com as cores do Flamengo: “João de
Lucas (sic) só soube como era a almofada depois que se casou: uma almofada toda
bordada, de seda vermelha e preta, e com um enorme escudo do Flamengo, bem no
centro. A almofada ficou colocada no lugar de honra da sala de visitas da casa
de João de Lucas, para escândalo de todo Vascaíno que aparecia por lá”. Para
evitar a gozação dos amigos vascaínos, “João encheu as paredes de flâmulas do Vasco. Quem
passava pela rua via as flâmulas , pois as janelas da sala de visitas estavam
sempre abertas, não via a almofada. Quem entrava, porem, olhava, como
fascinado, para a almofada que Dona Helvecia tinha bordado”. Casados, eles não
frequentavam os estádios, em casa sua esposa percebia que a alegria e a
tristeza do marido variavam de acordo com o desempenho de seu time. Para
surpresa de Lucas, sua esposa silenciosamente ia se tornando vascaína só de
acompanhar a paixão do marido pelo clube. Ela faz um pedido para o marido lhe
levar em São Januário para ver um Vasco e Flamengo: “Para não passar os
domingos longe do De Lucas, dona Helvecia pedira para ver aquele Vasco e
Flamengo. Podia ter escolhido outro jogo, antes ou depois, Mas não, escolhera
justamente aquele jogo, um Vasco e Flamengo. Outro jogo não provaria nada, que
ela não era Flamengo, que era Vasco. “Você quer saber de uma coisa, meu bem?
Disse o De Lucas. “Foi Deus que mandou você hoje aqui”. Deus ou Nossa Senhora
das Vitórias. Saíram os dois de braços dado de São Januário. A primeira coisa
que João de Lucas fez foi dar sumiço na almofada toda bordada com o escudo do
Flamengo”. Mario Filho termina de contar sua história que todo vascaíno queria
ler. A esposa, em nome do amor, troca de clube e passa a torcer junto do marido
pelo mesmo time.
O
jornalista Mario Filho vivia um momento especial com o início das obras de
construção do Maracanã em agosto. A cada mês o jornalista fazia questão de
comparecer com uma equipe de reportagem e registrar a evolução das obras e
fiscalizar o cumprimento dos prazos. Ele que, no ano anterior, havia lançado
sua principal obra, “O Negro no Futebol Brasileiro”.
Começa o campeonato carioca de 1948 e o favoritismo do Vasco leva a sua torcida acompanhar com tranquilidade os
jogos, com exceção de um clássico em São
Januário, que terminou em confusão envolvendo as torcidas quando “a cancha foi
invadida por torcedores do Fluminense, que dominados pelo entusiasmo, chegaram
até próximos as sociais cruzmaltinas. Foi então, que elementos do Vasco,
tomando a invasão como um acinte, procuraram enfrentá-la. Houve discussão,
desafios e agressão. Policiais fardados e em traje civil, aumentaram ainda mais
a confusão, aqueles, principalmente, com franca distribuição de pancadas. Como
se tratava de violência, muitos revidaram. E ai, aumentou a confusão porque um
dos policiais puxou da arma e disparou-a. Ao tumulto, felizmente, vingou o bom
senso da maioria”[2].
Pouco antes em um outro episódio, a torcida vascaína recebe os elogios
de um cronista do Jornal dos Sports que mesmo perdendo em São Januário para o
Boca Juniors por 5 a 3, não provocou protestos, pelo contrário: “gostei de ver
o comportamento da torcida do Vasco (...) ouvi comentários de todas as matizes
ao sair do estádio. E não ouvi um só que exprimisse mága, agravo ou ataques a
diretoria ou ao técnico. Sofreu o Vasco uma derrota esmagadora, e a esta
derrota não correspondeu a histerismo algum de sua torcida”.
Para este campeonato carioca de 1948
tudo indicava que o Vasco venceria facilmente e levantaria o bicampeonato com
facilidade. No entanto, em campo a surpresa foi o título do Botafogo com duas
vitórias sobre o Vasco. A primeira em São Januário no primeiro turno e a
segunda, na última partida disputada, no estádio de General Severiano. Com a
vitória assegurada por 3 a 1, os torcedores botafoguenses levantavam os lenços
brancos mostrando para os vascaínos o sinal de despedida do título de
bicampeonato sonhado pelos vascaínos.
O
troco do Vasco seria no ano seguinte, com o maior ídolo do Botafogo nos anos
1940 vestindo a camisa do Vasco e sendo campeão carioca pelo primeira e única vez.
Fonte: Livro “100
anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
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