“UH cadê o Bandeirão, sumiu.”
Canto da torcida contra a rival
1993 Explode Coração
Edmundo foi considerado a principal
revelação do futebol brasileiro no ano anterior. A torcida vascaína via no
jovem e impetuoso atacante um substituto a altura de Roberto Dinamite (que se
despedia dos gramados) para ser o grande ídolo nos anos 1990. No entanto, o
sonho de ver Edmundo brilhando no Vasco em 1993 foi desfeito com a sua
contratação pelo Palmeiras em janeiro. O clube paulista que contava com a
parceria da Parmalat desde 1992, leva Edmundo por US$ 1,8 milhão, no maior
investimento da empresa que prometia um “Dream Team” para os paulistas.
Mas a fábrica de talentos em São
Januário estava a todo vapor. Em março quatro jogadores vascaínos conquistavam
o título mundial da categoria. Eram eles. Gian, Yan, Bruno Carvalho e Jardel. A
recepção dos jogadores ao Brasil contou com a torcida vascaína que recebe as
jovens promessas com muita animação.
A
festa nunca caminhou longe da guerra entre as torcidas. Em 1993 o perigo de um
conflito sem precedentes estava aberto. Apesar da torcida Raça ser a maior
organizada do Flamengo, a maior rivalidade da Força Jovem neste período era a
Jovem do Flamengo (TJF), pois ambas reivindicavam a primazia no uso da
violência e foram diversos confrontos por toda a cidade. Roubar camisas,
bandeiras e materiais de bateria eram práticas constantes que faziam de cada
objeto roubado, o significado de uma vitória sobre o adversário. Em toda a
cidade do Rio de Janeiro, em Niterói e São Gonçalo cada grupo destacava
pichadores para marcar os muros e delimitar o poderio em cada região. Para
muitos integrantes destas torcidas, o que acontecia dentro dos gramados tinha
uma importância menor. Embora condenada pelos seus lideres, o sentimento de
amor a torcida ficou maior que o amor ao clube.
Maio
de 1993. Membros da Torcida Jovem do Flamengo entram em desespero quando vão
até sua sede no Maracanã conferir a denúncia de que pessoas encapuzadas
invadiram a sala da torcida e roubaram o bandeirão. O material não estava lá.
Boatos por toda a cidade e até em Minas e São Paulo, dizem que a enorme
bandeira com o símbolo da torcida (um tanque) foi recortada em vários pedaços e
distribuída pelos rivais. A imprensa só divulgou o fato duas semanas depois do
fato consumado: “a Torcida Jovem do Flamengo não se conforma com a bandeira
roubada, há duas semanas, de sua Sala no Maracanã. Fez uma nova para apresentar
no jogo de ontem, mas ainda está revoltada com a Suderj.“Houve um acerto entre
a turma que invadiu nossa Sala e os funcionários do Maracanã. Eles se
defenderam, dizendo que foram amarrados pela torcida do Vasco. No entanto,
quando foram fazer exame na Polícia, não tinham nenhuma marca nos pulsos. Eles
levaram um bom dinheiro para deixar os ladrões entrarem. Isso aqui é uma
vergonha, tem corruptos por todos os lados. Onde iriam conseguir um maçarico
para arrombar a porta? Só pode ter sido na própria oficina da Suderj”, protesta
um torcedor” [1].No primeiro Vasco e
Flamengo veio a gozação com o canto: “UH cadê o Bandeirão, sumiu.”
No
início de 1993, novas ”familias” se formavam com destaque para Resende (11ª) e
Petrópolis (12ª). A novidade foi a formação de um núcleo dentro da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (13ª), única torcida do Brasil a contar com uma
organização dentro de uma Universidade. O grupo contava com estudantes de
vários cursos, especialmente Comunicação, Filosofia, História. Direito e
Educação Física. O Jornal da Força Jovem contou com o auxílio destes estudantes
enquanto ele existiu.
Durante
o campeonato carioca, numa partida entre Vasco e Americano em São Januário,
torcedores do Vasco agridem o presidente da federação carioca de futebol e
torcedor do Americano. O dirigente promete vingança pelos jornais e acusa a
Força Jovem: “Esta é a oportunidade que eu precisava para banir de vez estes
marginais, que dizem fazer parte de Torcidas Organizadas e que só vão para os
Estádios para bagunçar e tumultuar. Vou persegui-los com todas as minhas forças
e não terei paz enquanto não liquidá-los”. Este foi o desabafo do Presidente da
Federação de Futebol do Rio de Janeiro, Eduardo Viana, que ainda traz no rosto
as marcas da agressão que sofreu por um grupo de torcedores, segundo ele, da
Força Jovem, após a partida entre Vasco e Americano, em São Januário.São
diversos hematomas e escoriações por todo o rosto. As pancadas atingiram todo o
corpo. Chegou a se temer que ele tivesse sofrido fratura nas costelas.O
Dirigente já decidiu que jogará pesado contra as denominadas Torcidas Organizadas
e começará pela própria Força Jovem. Ele garantiu que tem condições de
reconhecer dois ou três agressores, e que pagarão pelo resto.....”
Com
o Maracanã restabelecido, o campeonato carioca prossegue e o Vasco conquista o
bicampeonato em junho, no empate com o Fluminense. Na ocasião a Força Jovem
proporcionou uma das mais belas queimas de fogos da história do Maracanã.
Fazer
a festa sempre foi uma tradição da Força Jovem que conseguia aliar espírito de
luta, sacrifício e dedicação, com bom gosto e talento para embelezar os
estádios. Por isso, na despedida de Roberto Dinamite do futebol, em março de
1993, que a FJV tenha sido designada para fazer a cascata de fogos que saudou o
ídolo na entrada em campo.
Além
do visual a vibração da bateria é outro elemento que diferencia uma grande
torcida. Ela representa o coração da organizada, é o ponto de apoio e
referência para os torcedores. É dela que os cantos, gritos de guerra e as
músicas entoadas ganham o ritmo e a harmonia da arquibancada, empolgando as
multidões. “Explode coração na maior felicidade...” cantam os torcedores o
samba mais popular de 1993, da Escola da Tijuca, Salgueiro.
A
magia da bateria dá a integração aos membros da torcida, unindo-os num ritual
só igualado aos desfiles das Escolas de Samba. Futebol e Samba, um casamento
perfeito, no entanto, a riqueza musical das Torcidas Organizadas faz dessa
junção apenas uma das várias fórmulas de deixar os torcedores em estado de
êxtase total. A combinação de vários ritmos, dá um tempero especial conciliando
o samba ao rock e ao funk, passando pela paródia de músicas infantis. A idéia
principal é não deixar de fora nenhum ritmo. Na folia, todos os gêneros
musicais têm vez. Situada um pouco acima, a esquerda do túnel de entrada da
facção, a bateria da FJV ocupa 3 degraus da arquibancada com 10 surdos, 16
caixas de guerra, 5 repenique, 4 tamborins e 2 chocalhões, são mais de 40
componentes num sistema de revezamento são os encarregados da bateria da Força,
tendo como um dos destaques o Diretor de Bateria da Imperatriz Leopoldinense.
Em
seguida do Campeonato Carioca os clubes disputam o Torneio Rio-São Paulo.
Depois da partida entre Palmeiras e Flamengo em São Paulo, os torcedores do
Flamengo são pegos numa emboscada, sendo alvo de coquetéis molotov. Vários
ficam feridos com queimaduras. Nas investigações policiais, alguns torcedores
do Vasco são acusados de planejarem a ação violenta.
Em
setembro de 1993 a bateria da Força Jovem foi decisiva no jogo entre Brasil e
Uruguai válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo nos EUA. Tão importante
como Romário, que voltava a brilhar no estádio e marca os dois gols da vitória
diante de mais de 100 mil torcedores. Aquela partida memorável seria uma das
últimas a contar com um público deste tamanho vendo a seleção brasileira. Pela
importância do jogo, podemos considerar a partida mais importante da seleção no
Brasil nos anos 1990. A festa da torcida vascaína foi proporcional ao que os
jogadores mostraram em campo.
No
final de 1993 a sede da torcida FJV é transferida para o bairro da Piedade. Em
local de fácil acesso (em frente a estação), a nova sede possui melhor
infra-estrutura, facilitando o trabalho da diretoria. Entre as primeiras
medidas no novo local ficou estabelecido o contato com o sociólogo Herbert de
Souza, o Betinho, líder da Campanha contra a Fome, que mobilizou milhões de
brasileiros. A Força Jovem foi a primeira torcida a buscar este contato
arrecadando 2 toneladas no jogo entre Vasco e Fluminense[2].
Neste
ano uma pesquisa do IBOPE divulgado pela Revista Placar em outubro revela o
perfil econômico das torcidas cariocas e o nosso clube apresenta um inegável
perfil popular. “o Vasco da Gama, associado no imaginário à rica colônia
portuguesa carioca, apresentava um gráfico exatamente inverso a tal imagem: 14,6%
das classes A-B; 17,7 % da C e 21,6% das D-E” (Franco Júnior, 2007, p.208). Em números absolutos o resultado era: 1º Flamengo 41,9 %, 2º Vasco 18,4%, 3º Fluminense 16,0%,
4º Botafogo, 10,1%, 5º America 1,0%, Nenhum
8,2 % e Outros 4,4 %.
A esperança do inédito tricampeonato
carioca em 1994 e a conquista do tão sonhado tetracampeonato mundial nos EUA,
passam a serem os maiores desejos dos vascaínos para o próximo ano. O futebol
brasileiro apesar de viver um longo período sem títulos importantes e ver a
saída constante dos maiores jogadores para o futebol europeu, ainda é a maior
paixão nacional.
Fonte: Livro “100 anos da
Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
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