“na primeira, segunda ou décima nona
divisão, serei sempre Vasco”
Aldir Blanc
2009 Amor Infinito
Havia muita expectativa dos torcedores
vascaínos e da imprensa em geral sobre o desempenho do presidente Roberto
Dinamite para a temporada de 2009 quando o clube teria o desafio maior de
voltar para a primeira divisão e formar um time capaz de honrar a tradição
vitoriosa do clube.
Como havia assumido o clube em meio
a uma grave crise econômica e política, Roberto conseguiu o apoio das torcidas
organizadas vascaínas e da grande mídia em seu começo de mandato. A culpa pela
queda em 2008 caiu toda sobre os ombros do ex-presidente Eurico Miranda. Agora,
passados seis meses e com uma grande reformulação no elenco, o novo presidente
teria sua chance de mostrar todas as mudanças positivas que seriam
implementadas.
Dentro e fora de campo esportivo, é
visível que Roberto Dinamite tem uma simpatia de diversos setores da sociedade.
Artistas, políticos, empresários, intelectuais e dirigentes esportivos manifestam
publicamente que o Vasco é um novo clube. Aldir Blanc, desafeto de Eurico
Miranda, lança o livro Vasco, A Cruz do Bacalhau, último livro da coleção da
editora Ediouro, proibido na época do ex-dirigente. Blanc comenta o cenário
político deste novo período: “foram afastados pelo voto democrático e livre, em
eleições sem fraude, sem baixarias e, por incrível que pareça, porrada nos
membros da oposição, como aconteceu no passado”. Roberto é apresentado como a
antítese de Eurico, em lugar da truculência, da desonestidade, da ditadura,
assume um democrata, liberal e moderno dirigente que promete reconciliar o
clube com os inimigos declarados de Eurico Miranda.
Agostinho Taveira, conselheiro do
Vasco, é nomeado pelo clube para ser o elo de ligação com as torcidas
organizadas. O maior desafio é fazer um diálogo com a FJV, envolvida em crises
internas. A diretoria atual tem grande apoio do clube e se inicia um processo
de aproximação entre as duas instituições.
Para o campeonato carioca o clube
apresenta seu elenco nos moldes dos times europeus e abre São Januário para a
sua torcida que comparece em bom número. Mais de duas mil pessoas, numa
sexta-feira pela manhã, atendem ao pedido da diretoria que faz uma festa com
direito a foto oficial, chuva de papel picado e queima de fogos.
Neste período a nova diretoria da
FJV atuava intensamente para começar o ano corrigindo os erros do passado. Só
de dívidas da última gestão são quase R$ 50 mil reais. Uma reunião entre os
lideres de fora da cidade é realizada nas arquibancadas de São Januário. “No
dia 10 de Janeiro em reunião histórica nas arquibancadas de São Januário,
estiveram presentes os líderes de diversas Famílias de fora da Cidade do Rio de
Janeiro. São elas: 12ª Família (Caxias/Petrópolis), 15ª (Nova Friburgo), 16ª
(Teresópolis), 17ª (Volta Redonda), 18ª (Juiz de Fora), 19ª (Campos), 20ª
(Região dos Lagos), 22ª (Brasília), 23ª (São Paulo), 35ª (Belo Horizonte), 36ª
(Bahia), 45ª (Cuiabá), 57ª (Goiás) e 59ª (Itaboraí). Também participaram da
reunião os Dinossauros e os membros da nova Família Costa Verde”.
Na festa de comemoração dos 39 anos
da torcida, o clube abre as portas da sede no Calabouço para a torcida fazer a
sua confraternização. Estavam presentes os componentes de diversas gerações e
membros de torcidas de outros estados, como a Mancha Verde que retribuiu a
visita da FJV a sua festa em São Paulo, no mês de janeiro, comemorando os 26
anos de fundação. Na ocasião a FJV é presenteada com um quadro e um troféu em
homenagem a “Amizade Perpétua” da “união sinistra que ninguém segura”.
No campeonato de 2009 o grande
momento foi o jogo entre Vasco 2 x 0 Flamengo no Maracanã quando 5.000
componentes foram a pé de São Januário até o palco do jogo: “a caminhada
ocorreu sob o clima de paz e confiança e há tempos não víamos a torcida tão
coesa e decidida a ajudar o Vasco nos enfrentamentos contra o seu rival. Este
grande ato, o maior da história da torcida, aconteceu no feliz domingo em que a
Mulambada levou um sacode de 2 X 0. Dentro de campo, a equipe foi aguerrida e
acreditamos que esta foi a forma que o time usou para retribuir a calorosa
recepção da massa Vascaína”.
Fora de campo a FJV aproveitou que a
banda Iron Maiden fazia um show na Praça da Apoteose, em março, para
presenteá-los com camisas do clube e da torcida. Em abril era inaugurada a nova
sede na rua Uruguaiana, no centro da cidade. “A FJV escreve um novo capítulo em
sua história. O espaço, duas salas no Centro do Rio, representa um ponto de
encontro para os associados e amigos. Na comemoração desta conquista, o goleiro
Tiago e o atacante Rodrigo Pimpão, marcaram presença, assim como inúmeros
Chefes de Família e a Rainha Daniele Sperle”.
No
Dia Internacional das Mulheres (8 de março) a FJV em São Januário, com apoio da
Família Feminina, distribui duas mil rosas para as torcedoras além de brindes
femininos e produtos de beleza. O presidente da Força Jovem, Luís Cláudio, o Claudinho, reforçou
a boa intenção da Torcida Organizada: “queremos trazer as mulheres de volta aos
estádios, dos quais se afastaram devido a violência nas arquibancadas. Para
isso, começamos a Campanha Força Feminina nos Estádios”.
Em
maio começa a campanha para o Vasco conseguir alcançar 100 mil sócios.
Tratava-se do projeto de marketing intitulado “O Vasco é Meu”. Uma ambiciosa atividade
de propaganda que contou com chamadas em todos os meios de comunicação,
utilizando atores e atrizes famosos convocando a torcida para aderir a este
novo modelo de pertencimento clubístico.
A
primeira grande divergência da FJV com a administração de Roberto Dinamite
surge quando um membro da diretoria vascaína resolve criar uma grade em São
Januário numa “modernização” do estádio, visando criar novos setores. A torcida
reagiu e o clube voltou atrás e retirou as grades. A FJV emite uma nota sobre a
sua posição no caso chamado pela torcida de “Grade da Vergonha”: “setorização
injusta, que somente pode ser feita como parte de uma reforma mais ampla do
Estádio que proporcione conforto e segurança para todos os setores. Separações
não combinam com a alma popular que marca o espírito vascaíno. São Januário é
um orgulho para todos. A história de nosso Estádio marcou não só o esporte, mas
a própria vida política do Brasil. Sem medo de exageros, São Januário está
entre os símbolos da democracia em nosso país. O Vasco é povo e em nosso
Caldeirão: Trabalhadores, Empresários e Estudantes misturam-se, sem
preconceitos, unidos pelo Amor ao Vasco”.
Nesta época é criada a FTORJ
(Federação das Torcida Organizadas do Rio de Janeiro) com intuito de unir as
torcidas cariocas que passavam por uma intensa campanha da mídia pela extinção
das mesmas. Dois vascaínos fazem parte da primeira diretoria: o Vice-Presidente
Patrimonial e Social, Jorge Henrique da Silva Matos, “Policinha” (Força Jovem
do Vasco) e do Conselho Fiscal, Rodrigo Granja Coutinho dos Santos
“Batata” (Ira Jovem). Em
julho a FJV participou do Seminário das Torcidas Organizadas que os Ministérios
do Esporte e da Justiça realizou na Cidade de São Paulo. Contou também com a
participação da FTORJ.
Começa o campeonato brasileiro e a
torcida do Vasco comparece em peso nos jogos em São Januário. Mas o grande
destaque serão os jogos no Maracanã quando a torcida dará grandes demonstrações
de amor ao clube com recordes de renda e jogos com público superior a quase
todos os outros da 1ª divisão. O clube lança uma campanha televisiva chamada “O
Vasco é Meu” para atrair novos sócios. Vários artistas aderem a campanha
fazendo depoimentos favoráveis ao novo ambiente que o clube passava.
A Força Jovem lança o desafio para
os seus integrantes não esmorecerem e ajudarem o time a vencer seus jogos em
casa: “Faça a diferença para o Vasco voltar à Série A e para mostrar para todo
o Brasil qual é a Maior e Melhor Torcida Organizada do País. Guerreiros unidos
pelo mesmo ideal: a Força Jovem e o Vasco!”
A GDA completava 3 anos em agosto e
já experimentavam as primeiras
contradições com o crescimento do número de participantes e a dificuldade de
controlar suas ideias originais com a nova realidade. Neste mês eles lançam um
manifesto: “fazendo chegar ao público em geral, às autoridades legalmente
estabelecidas e em particular à mídia, quem somos, o que somos e o que
pensamos: antes e acima de qualquer coisa Um grupo de Vascaínos que se uniu
para amar o clube, sem nenhum interesse financeiro ou político-partidário!”
Antes identificados com o modelo das
torcidas argentinas, eles ampliam o discurso para os ultras italianos e
garantem que ter uma identidade nacional: “buscamos inspiração no apoio incondicional
das Barras Sul-Americanas, na consciência política dos ULTRAS da Europa,
estilos diferentes de torcer das nossas tradicionais Torcidas Organizadas
(T.Os), onde é obrigatório cantar durante todo o jogo, não importando o placar
da partida e onde buscamos levar o torcedor a se associar à sua paixão, com o
objetivo de participar mais ativamente dos destinos do seu Clube. Mas não somos
uma ‘cópia pura e simples’ de nada estrangeiro: nos consideramos um passo além!
Juntamos o apoio ‘enlouquecido’ latino, a atividade política, sem ser partidária,
dos europeus, com a ginga e o bom humor típico dos cariocas. Isto sintetiza o
Movimento Guerreiros do Almirante!”.
Também em agosto contra o Ipatinga
no Maracanã, a FJV estreia seu novo bandeirão depois de 10 anos que havia sido
feito a última grande bandeira. Acusados pela oposição de usarem a torcida para
se beneficiar, a FJV escreve em seu site oficial: “que esse bandeirão sirva de
“cala boca” para todos que erguiam os dedos para apontar e dizer que nós só
queríamos dinheiro. É verdade, que nossa torcida teve algumas Diretorias assim,
interessadas apenas em ganhar dinheiro, mas nós somos diferentes, queremos
dinheiro para investir na Torcida e levá-la de volta ao seu merecido lugar como
grandiosa. A nossa obrigação é com a Força Jovem do Vasco e nós vamos fazer de
tudo para devolvê-la ao status de maior, melhor e mais unida”.
Neste momento de recuperação do
clube e da FJV muitas acusações são feitas sobre as diretorias passadas. O que
revela a necessidade deste grupo querer romper totalmente com as práticas
anteriores e recriar uma identidade positiva da torcida junto aos antigos
membros e a massa vascaína. São feitas várias campanhas sociais como o sopão e
a campanha do agasalho, além da criação da TV Força no final do ano, sendo a
primeira torcida a ter TV própria acessada através do seu site. Era uma
resposta direta contra quem queria acabar com as torcidas organizadas mas utilizando suas imagens para promover os seus
produtos: “quando a televisão mostra e faz as chamadas pros jogos, mostram e
vendem nosso espetáculo, em torcidas organizadas há muita gente de bem, que é
sadia, que tem instrução, respeito e caráter, não podemos deixar essa mídia
fajuta, a mesma mídia que lucra com a nossa festa, que vende nossa imagem, nos
sufocar, pressionando o nosso fim, dizendo que somos marginais, violentos e
tudo mais que ouvimos”, defende André Sagat.
Durante todo o ano são feitas
grandes entrevistas com os membros da nova diretoria da FJV divulgadas pelo
site. Em muitas delas não faltam acusações sobre as antigas diretorias: “a
torcida vem de guerra em cima de guerra, briga em cima de briga chegou uma hora
que ninguém estava agüentando mais (...) uma dívida no qual chegava a quase de
50 mil reais deixada por outras diretorias e que prejudicava a torcida de diversas
maneiras” (...) “quando assumimos a torcida, não havia um bambu sequer,
tínhamos dois bandeirões, várias bandeiras lindas, bateria maravilhosa, tudo
isso foi roubado pela antiga diretoria vendida ao Eurico, será que esses caras
são Força Jovem?”.
Nas
entrevistas todas são unânimes em lembrar o passado glorioso da torcida na
década de 1990 quando a facção alcançou o seu maior sucesso sendo temida e
invejada por todo o país: “a Força trilhou sua grande trajetória na pista,
chegando a ser eleita a Melhor Torcida do Brasil, ficamos conhecidos
nacionalmente, somos a Torcida com mais vitórias na pista, envolvida nos
maiores combates, conquista de territórios, de matérias (faixas, bandeiras,
bandeirão, bateria), grandes vitórias em outros estados (...), quem não se
lembra da campanha “EI, EURICO, 171”, mas de 2000 até 2007, perdemos espaço,
credibilidade, diretores da torcida a venderam literalmente, lucraram muito
através dela, abandonaram nossos associados, isso gerou muita briga, desunião,
muitos se afastaram, a mística de ser força jovem foi manchada, surgiram
dissidências, uma situação lamentável. Agora que estamos voltando, a torcida
recuperou a identidade, depois de tantas brigas internas, retornamos aos
trilhos” afirmou André Sagat (Paquito), Vice Presidente da Força Jovem do
Vasco. Ele também faz um apanhado geral sobre as alianças mantidas pela FJV
neste período: Mancha Verde, Galoucura, Cearamor, Mancha Azul, todas do Bahia,
Inferno Coral, Fanáutico, Força Jovem do Goiás, as do Paysandu, do Grêmio,
Torcida Jovem do Botafogo”.
O jogo mais marcante da campanha de
retorno a série A foi contra o Juventude, no Maracanã, quando milhares de
vascaínos tomaram o estádio desde cedo fazendo uma festa inesquecível para os
presentes e todo o Brasil, já que a partida foi transmitida ao vivo para todo o
país. A FJV realizou um gigantesco Mosaico que cobriu todo o setor verde do
Maracanã. Nele estava escrito o nome da Força Jovem. No segundo tempo do jogo,
onde o cruzmaltino pode garantir a volta à primeira divisão do futebol
brasileiro, torcedores vascaíno recolheram a principal faixa da organizada e
abriram uma com os dizeres: "Eurico - 2ª divisão. A história não perdoará.
Obrigado Dinamite". Em todo o estádio começaram os gritos de “Ei, Eurico,
vai tomar no cu”.
Apesar de o time ser limitado, a
campanha de 2009 entra para a história da torcida como um momento de
reerguimento de todos: clube e torcida. A esperança de dias melhores foi o que
ficou nos jogos memoráveis deste ano. Em cada vascaíno era possível perceber o
orgulho da torcida que passou a usar a camisa do time durante todo o ano e
mostrar o seu sentimento de fidelidade. A mensagem no site da FJV antes do
campeonato brasileiro parecia ser profética: “Cada capítulo do futuro se
escreve no presente. Este é o nosso tempo e a torcida sabe do seu papel e vai
fazer a festa, A nossa missão é estar junto ao Vasco da Gama em mais uma
histórica virada. Nosso amor não tem divisão”
Fonte: Livro “100 anos da
Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.
Vasco Maracanã 2009 |
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